Minha Páscoa inesquecível (ou era Carnaval?)
By H.H.Heinz
 
 
Só sei que o feriadão iniciou na quinta ao meio-dia. Saí do meu emprego, uma fábrica de memórias onde eu era vendedor para o interior do estado, para almoçar com duas de minhas colegas mais queridas. O plano era aproveitar a tarde de quinta para fazer algumas coisas no centro da cidade e curtir o feriadão numa boa. Ir ao Bar dançar e tentar encontrar uma ou duas garotas com quem eu desejava iniciar algum tipo de relacionamento.

Sem stress.

Adoro viajar pelo interior. As pessoas são de um gente-finismo cativante. Pagam (bem) por giga-bytes de mega-aventuras que nunca viveram realmente. Do you think I’m a kind of son of a bit?

Às 4:30, depois de três jarras de vinho no almoço, cheguei em casa, com uma vaga lembrança de algo que eu deveria ter feito no centro. Dormi até as 8:00. Estava solteiro de novo. Por um lado é legal, mas por todos os outros é totalmente sem graça.

Nessa época eu tocava numa banda de rock, com meus amigos Me, Myself and I, que ainda não era anão. Para nos contratar, a pessoa só precisava saber que a banda existia, procurar um por um dos componentes para convencê-los a tocar, e torcer para que nenhum tivesse nada mais importante pra fazer, o que era o mais difícil, um sempre tinha que ir ao barbeiro, ou levar algum filho no MacDonalds... mas mesmo assim, tocávamos de vez em quando.

Sem stress.

Numa das noites do feriadão fui ao Bar com minha amiga Lápis Lazuli, que havia feito um delicioso jantar. Talvez não devêssemos ter bebido as 3 garrafas de vinho antes de fumar aquela bomba, mas chegamos bem alegres. Eu não estava disposto a gastar muito, por isso só fui com 20 reais no bolso. Não queria beber muito, e porcaria, nem pensar. Pedi um refri e quando fui pagar com uma nota de 10, o cara me diz "xi, não tem troco, eu vou anotando e tu paga outro dia..." .

Aquilo não estava começando bem. Aonde está o trafi mesmo?

Pegamos a coisa, fui ao banheiro e depois passei pra Lápis Lazuli.

Uma das garotas do primeiro parágrafo estava lá. A cantora. E eu louco pra dizer que adorava a voz dela. E as pernas finas e longas também. Mas é cedo, dá pra tomar mais um conhaquezinho.

Já estava eu na fila do banheiro de novo, quase chegando, quando me aparece o Myself, com aquele sorriso que me derretia. Eu o amava como a um irmão. Só uma coisa eu não desculpava: como ele conseguia beber mais do que eu?

-E aííííí, tô com as mâos limpas, deixa eu sacudir pra ti?

Já tinham dado a barbada do pó prô gracioso.

- Claro, vamos pagar esse mico, de duplinha no banheiro...

Bem, mais alguns intermináveis minutos e debaixo de xingamentos e risinhos sarcásticos do resto da fila, entramos. Peguei a buchinha e dei pra ele, enquanto mijava.

- Ô cara, tá me gozando? Isso aqui é um pedaço de chiclé, nem inteiro tá....

- Bah, parece que pagamos um mico à toa, a Lápis Lazuli me deu a buchinha errada..

Na saída do banheiro, pedi um chiclete pra Lápis, dei a bucha prô Myself e disse que ele ia ter que ir sozinho, agora eu ia dizer pra alguém como eu gostava de vê-la cantando e dançando .
- Sabe, eu me amarro nessas tuas pernas finas...

No meio do caminho, tocou uma música legal... e lá estava o pudim aqui dançando, com Lápis Lazuli, que tentava, sem muito sucesso, lembrar que fim tinha levado aquela ponta de chiclete. Duas ou três doses a mais de conhaque e o comentário sobre as meias de Piu-pius "que deixam tuas pernas mais lindas ainda" na ponta da língua, parti prô ataque à cantora.

Lamentável, ela já tinha ido embora.

Sem stress.

Seis da tarde, dia seguinte. A cabeça começava a desistir de querer estourar. Caralho! Combinei de ir jantar com o Taquito! Tudo bem, valia a pena, eu gostava muito dele, e além disso, era uma boa hora pra iniciar os trabalhos etílicos.

Mas decidi não ir ao bar aquela noite. No meio da madrugada, acordei e, fumando um cigarro, vi um pedaço do Cine Privê, na Band. E fiz sexo com minha mais fiel e antiga amante, minha boa e velha mãe, digo, mão.

Eu estava lá, no Bar, noite seguinte, encostado numa janela, quando o sujeito veio puxar assunto. Tenho que me lembrar de pegar o "Não perturbe" de algum hotel, e colar na testa. Será que adianta?

- E aí Bocó, e a banda?

(Puta que pariu, de ti eu não podia esperar nada mais original mesmo) - Firme.

- Tão tocando?

O nariz do cara tava escorrendo. Bêbado, burro e bandeira...

(Ai que saco, vai vê se eu não tô dando o rabo lá na esquina) - É, naquela de sempre.

- Dãã, e aquela guria loira, que era tua mulher ou namorada, não sei direito...?

(Sai ô ridículo, tu sabe muito bem o nome dela, cagão. Eu sei que vocês tiveram um caso. E ela até considerava o cara...) - Tá morando na Austrália, acho que ela tá bem legal por lá.

- Ah, vocês não têm mais contato, não tão mais juntos, é?

(Múmia ranhenta, energúmeno, tem 20 mil léguas submarinas entre nós, como podemos estar juntos, sua besta? E além disso, quem disse que é da tua conta?) - De vez em quando nos mandamos uns e-mails ...

E ficou mais um otário falando sozinho no bar.

Não sou obrigado.

Sem stress.

O Bar tava legal, a música boa, e comigo, e deixando minha alma leve, dois anjos de 15 anos fazendo a boa ação da noite, dançando com o tio velho.

E de repente eu vejo a louquinha linda do cabelo vermelho. Mais uma opção do primeiro parágrafo. Até que esse texto tá coerente. Mil papos passaram por minha mente enevoada. One more Jack, e ela seria minha. No caminho encontrei o Quico, grande friend, que veio me acusando de ser " um ser anti-social", que dava o meu pó pra todo mundo e sempre recusava quando me ofereciam. Não perdi mais do que uns segundos pra balbuciar algo sem sentido como resposta. E quando dei por mim, estava fumando um, de carona num carro, indo pra outro bar.

Destino de bêbado não tem dono.

Sem stress.

Segunda-feira, 7 da manhã, na estrada. O toca-fitas rola Prodigy a toda altura. Vou para o interior, eu e minhas memórias. Isso é que é vida.

O nome é Bocó. Just Bocó.