Sem querer radicalizar radicalizando, como diria o sociólogo Chaves, a maior parte dos amigos de verdade conhecemos na infância. Seja na mesma rua, bairro, escola ou por que não, o quartel, fase esta em que o vivente já estaria na 3ª infância. Na adolescência, além de travar uma inglória e covarde luta no cinco contra um, o cara ainda descobre o roque e um balaio de amigos desnecessários. No período adulto nem se fala. É no emprego, na faculdade, nos botecos, no prédio em que mora, na imprensa, no governo... Malas e malas para todos os gostos. Sorrisos e tapinhas nas costas numa eterna campanha para ser eleito e poder assumir lugar de destaque no condomínio do vínculo afetivo. Uma categoria clássica é a dos "conhecidos". Figuras que tu conhece de vista e se reparar bem, nunca parou para conversar. Mudam os técnicos do Inter e do Grêmio década após década e tu ainda não parou pra trocar uma idéia com os viventes. Recordando conhecidos d'outrora, citaria ainda aqueles que a existência pura e simples era motivo de chacota generalizada da galera. Os hábitos e os próprios nomes sofriam com o escárnio do povo e assim, Madebunda, Alespeido e Andebosta formavam um lépido trio unidos por laços congênitos. Madeleine, Alessandro e Anderson eram as suas identidades secretas e assim, protagonizaramo seguinte episódio:
Estávamos numa tarde quente de um verão morno coçando o saco na rua sem dinheiro. Tudo normal pr'uma piazada. Lá pelas tantas, Alespeido e Andebosta convidaram uma galera-funk de 3 ou 4 caras para jogar banco imobiliário na casa deles. Como sua mãe era muito "querida" deixava os dois pimpolhos levar alguns amigos pra brincar em casa. Chegando na porta do apartamento, Alespeido abriu-a, Andebosta entrou e viu sua mãe pelada no sofá, tipo saiu do banho e no calor, deixou a água refrescando o corpo. A turma ficou boquiaberta. A mãe dos caras era muito tezuda e pra completar, a Madebunda e uma amiga estavam enroladas em toalhas de banho. Mal sabíamos que o mais insólito de tudo aquilo estava por acontecer. Pouco surpreso com a situação, Andebosta, que era o mais novo, disse-nos com naturalidade:
- Entrem guris mas tapem os olhos com as mãos porque a minha mãe tá pelada.
Seguramos o riso e colocamos a mão no rosto com os dedos entre-abertos.
O melhor estava por acontecer. Crentes que passaríamos anônimos
pela sala rumo ao quarto, dando uma modesta espiadinha, fomos abordados
num interrogatório no melhor estilo DOPS. A mãe também
já estava de toalha mas mesmo assim, pr'um grupo de piás
tarados, o cheiro de buceta tava no ar. E elas perguntaram o nome de cada
um, sorrindo, escola de cada um, sorrindo, onde morava cada um, sorrindo
e n'aquele turbilhão de prazer e alegria perguntei à Madebunda:
- Que time é teu ? E ela respondeu sorrindo:-Colorada roxa ! Pulou
do sofá e começou a gritar Inter! Inter! Inter!, foi aí
que caiu a toalha, o cachorrinho passou correndo e levou a toalha para
a área e até hoje eu lembro aquela cena: uma ninfa de pele
clara e cabelos castanho-claros compridos, gotículas de água
disputando as curvas dos quadris, um corpo se movendo harmonicamente em
direção ao quarto de banho e o Alespeido gritava: - Tapem
os olhos, guris.