Um Viajante
por Alex Sernambi
 
 
Um dia eu acordei com a sensacão de um sonho estranho, era algo como uma viagem no tempo. Sabe como são os sonhos, às vezes eles vêm todo na memória, outras eles vêm em pedaços ou nunca vêm. Eu levantei, olhei em volta e parecia que estava tudo em ordem. Escovei os dentes depois do banho como sempre e saí. O prédio estava mais velho, mas aquilo não me impressionava, eu parecia preparado. Continuei o meu caminho até a banca, o jornal dizia 11 de março de 2018. Eu quase chorei, era verdade, eu tinha conseguido.Calma...o que eu tenho que fazer agora? Provavelmente nós pensamos nessa possibilidade de amnésia... nós? Será que eu tô maluco? Deixa eu pensar um pouco. Não, não, eu tenho uma missão, eu devo ter uma. A Mônica, ela pode me ajudar, ela é viciada em leitura científica, será que ela mudou? Ela é linda , se ainda estiver viva. Fui ao seu endereço, mas ela não morava mais lá. A vizinha me deu umas cartas antigas que ela guardara e uma pista onde ela poderia estar. Depois de dias procurando achei Mônica morando num pequeno quarto verde, manchado de infiltração e mal iluminado, alugado numa casa antiga na Bela Vista. Sua pequena janela protegida por uma grade de arame, abria no nível da rua movimentada. Mônica dormia numa cama de mola de solteiro que ocupava metade do quarto, mas ela estava lá, linda, não parecia que o tempo passara pra ela. Ela queria saber o que houve para eu sumir todo esse tempo. Tempo, a chave de tudo. Contei tudo que eu sabia. Ela parecia não acreditar, mas as minhas possiveis maluquices não a impediram de me beijar como nos velhos tempos, dela. Depois de transar, ficamos olhando pro teto um pouco. Perguntei se ela lera algo sobre alguma experiência com o tempo vinte anos atrás. Ela não lembrava de nada específico, somente algumas matérias que sairam na Superinteressante, e que talvez na biblioteca houvesse alguma coisa. Grande idéia. Fui lá, passei horas, mas nada me ajudava, não encontrava nenhuma pista. Voltei pra casa de Mônica. No caminho pensei que só o nosso reencontro já valia a viagem. Eu tinha que levar flores pra ela. Ela estava linda quando cheguei, estava de banho tomado e cheirosa. Mônica comprou chococook pra molhar no café c/ leite quente, que ela lembrava o quanto eu gostava. Ela me contou que fizera péssimos negócios, passou por cambalacheira, todos viraram-lhe as costas, eu havia sumido e agora eu volto dizendo que viajei no tempo, lhe tirando pra palhaça. Não é nada disso benzinho, olha pra mim. Ela viu que eu continuava o mesmo bagaço de vinte anos atrás. Mônica me pediu pra voltar e avisar a ela pra não fazer as mesmas cagadas que ela fez. Mas eu não tinha esse poder, nem sabia como voltar, pra onde e se queria voltar, eu não amava Mônica no passado, mas eu não poderia dizer isso a ela ou poderia? Fomos dormir e eu acordei aqui nesse cubículo que eu suponho ser o meu caixão. Imagino o meu corpo abandonado pelo tempo, congelado, na cama de Mônica, inconsolável com o segundo abandono.