UMA POLÊMICA NECESSÁRIA
(?)
por Álvaro Magalhães
e Arthur de Faria
Há um mês eu troquei um e-mail com o Arthur
de Faria, músico e jornalista, tentando iniciar uma polêmica
em torno do jornalismo cultural mundial e da capital da província
de São Pedro (centro do nosso mundo). Como durante toda a vida eu
acompanhei a “cena” cultural local, e sinto uma contínua queda na
qualidade do que é divulgado como opinião sobre as artes
(ou coisa parecida), e que isto influencia para a (queda da) qualidade
do que é programado, acho necessário que em algum lugar esta
polêmica seja bem feita. O breve diálogo abaixo mostra que
esta polêmica está acima das nossas forças, e que o
Arthur tem bala na agulha.
Álvaro - “Arthur de Faria, jornalista
militante: Eu tenho de tirar o chapéu para vocês, jornalistas.
Que habilidade vocês desenvolveram para falar e escrever sobre assuntos
usando termos que quase nada tem a ver com as categorias analíticas
das atividades às quais vocês se referem. Por exemplo, no
mundo jornalístico e da "opinião pública", "déficit"
público é sinônimo de rombo, coisa ruim, incompetência
e até ladroagem. Outro lugar comum é falar em conflito político
como algo também pejorativo, como briga de beleza, ou motivado por
interesses inconfessáveis. [Só pra esclarecer, há
muito tempo se sabe que "deficits" são necessários para as
economias nacionais andarem e que um ordenamento político não
autoritário implica na aceitação da diferença
e do conflito]. Mas me explica, como é que se escreve e se fala
tanto em música sem absolutamente falar de música? Admito
que facilita a comunicação, pois é só dizer:
"Pô, legal...." Ou então que a "atitude" é ou não
rock, etc, etc.
Arthur - “ Em primeiríssimo
lugar, acho que tem um erro de enfoque teu. Jornalismo musical é
uma coisa. Critica é outra. Bem diferente. O bom e velho Juarez
Fonseca é um claro exemplo de quem faz jornalismo musical, muito
raramente escrevendo uma crítica. Ele reporta o acontecido. E ponto.
Acho bárbaro. Já a crítica em si, acho que ela pode
ter vários níveis. Acho que em musica pop [no sentido o mais
amplo possível para o termo] cabe, sim, o jornalista escrever sobre
assuntos extra-musicais pra dar o contexto. Até porque muitas vezes
se trabalha mais com conceitos do que com notas. Acho que é muito
diferente tu escreveres sobre o ultimo disco do Anthony Braxton ou sobre
o mais recente “single” do Prodigy. Neguinho pra escrever sobre o Anthony
Braxton tem que conhecer um mínimo de jazz e música contemporânea,
muito alem da superficialidade do fato de o jazz ser cult ou prova de “status”.
Da mesma forma, neguinho pra escrever sobre o Prodigy tem que ter um mínimo
de condições de analisar a evolução do Techno
e o quanto ela tem a ver com o tipo de droga, o tipo de roupa, o tipo de
piercing, o tipo de acinte que combina no contexto. As vezes me parece
que essa tua visão - de homem velho auto-pretendido Rei dos Animais
- absolutamente etariocêntrica, se prende ainda muito em conceitos
que ainda são válidos, mas já não são
únicos. E não são há muito tempo. Desde os
anos 40 que tu já não podia analisar o Frank Sinatra exclusivamente
pelo ponto de vista musical. Ou o Elvis nos anos 50. Ou os Beatles nos
60. Ou mesmo o João Gilberto - cujo folclore associado é
essencial pra se avaliar o contexto inteiro do que ele representa. No mais,
acho que a gente devia chamar o Karamzim pra conversa.”
Realmente, não só o Sérgio Karam - jazzista notório
- deveria estar na conversa. Por exemplo, o professor L. A. Fischer volta
e meia mete o pau na imprensa cultural da capital gaúcha (feita
em boa parte por seus ex-alunos), com ocasional resposta. Será que
é mais um conflito geracional?
Mas, repito, esta polêmica está longe de estar bem colocada
e explorada. Será que o tal jornalismo cultural matou a crítica
e está ajudando a matar o espaço para a arte? O que parece
aconter na música vale para a literatura e para o cinema? Fischer:
será que temos de ter um jornalismo que defenda a cultura local,
assim como nossa crônica futebolística defende o estilo gaúcho
contra o dos alegres “cariocos” ? Os interessados podem se manifestar.
Ou Não!