A LEI BURRA
por J. Olímpio
ATO I
É uma vez, no assim chamado maior país da Sub-América, após as duas dinastias desregulamentarizantes (década final do século XX).
Mercê das pataquadas irremediáveis de seu des-governo, o imperador Beirando Nanico Garboso reúne seu ministério lupanar e esbraveja polidamente:
- Meus lustrosos e brilhosos sugadores escrotais. A nação se esfalfa em reboliço, as finanças definham a mais não poder, a indústria e a agricultura caem num pântano movediço e o povo já pensa em me f..., em me f...orçar à renúncia...!
Diante de tão pejorativa condição e semi-consciente de sua proverbial incompetência, conclamo a essa plêiade de sacripantas suscetíveis a lobbys de toda espécie, isto é, a vocês mesmos, que me safem dessa enrascada...!!!
O ministério atônito e apatetado - como sempre, aliás - simula um burburinho preocupado e, após dois minutos de parda deliberação, enfrenta seu sorbonicamente letrado rei.
- Sua Sapiência - diz o escolhido porta-voz -, em nome deste ilibadíssimo colegiado ministerial, eu, seu devotado Ministro das Rendas Públicas ouso propor a solução mais cabal para o infortúnio em que a nação se meteu após o recente plebiscito informatizado, que culminou com a gloriosa manutenção de Sua Sumidade no cargo máximo de nossa queridíssima Pátria, para gáudio de...
- Chega de circunlóquios lambuzatórios, Ministro Mão-Lenta! Vá logo ao que interessa: como sair dessa criogênica situação...!
- Pois bem, Sapientíssimo, eis a luminosa: usarmos e abusarmos da lei!
- O quê?!... Mas, por quem me tomas, ó semi-bardo???... Será porventura que o caro ministro cheirou cola e lambeu a lata? Que estultice é essa?!!!
- Explicar-lhe-ei, Magnificência. Patente está que nos revelamos um tanto aquém das expectativas de nosso povo, uns... (pigarreia) mal-disfarçados, porém, muito bem-intencionados defensores da casta dominante ( o que consideramos NAÇÃO). Então, sabedores dessas nossas limitações minimalistas e no intuito sincero de salvar "o nosso", digo, salvar a honra e a soberania deste Reino, comovidos lhe dizemos: USE A LEI!...
- Mas, mas... como, parva criatura?!?...
- É simples, Iluminado! Se a bancarrota é iminente, se a saúde está um caos, se a educação virou piada e se a cultura perdeu-se na poeira tantalizante das mídias eletrônicas... (pausa enervante)....
- Fale, filho da p...ropina!!!
- (...)
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ATO II
Dia seguinte, publica-se nos Anais Oficiais do Reino:
" O Excelsamente Ilustrado, Mestrado e Doutorado Sr. Dr. Professor Honoris Non Causa, el Rei Beirando Nanico Garboso, nas atribuições que a Carta Quase Magna lhe confere e mediante longa, dolorosa e nauseante deliberação junto a seu Honoravelmente Sórdido e Bem- Urdido Ministério, resolve proclamar o seguinte édito, para o bem dos mesmos e trepidação geral da população:
1- Ficam terminantemente proibidas todas as manifestações de quaisquer moléstias, infecções, pandemias, surtos viróticos e bacterianos, sejam individuais ou coletivas, afecções e / ou disfunções diversas, em função da nova política de seleção natural dos cidadãos válidos;
2- cancelam-se todas as garantias pessoais, trabalhistas e sociais, conquistadas através de ações populares e classistas anteriores a este decreto-direto-e-reto, retroativas até o século passado, excetuando-se a abolição da escravatura da raça negra, por ser reabilitada tal condição a todas as raças;
3- encerram-se todos projetos culturais em andamento e abortam-se todas as virtuais intenções em tal sentido, visto que, sem a presença altamente conscientizadora que são os valores culturais, as comunidades revelam-se muito mais dóceis e afeitas às determinações do Poder;
4- e, finalmente, declara-se ilegal o acesso e o uso de dinheiro pela população sobrevivente aos artigos anteriores, em função dos prejuízos que tal prática nefasta e desestabilizadora das elites causaria às massas sequiosas de ascensão a um nível de vida humanizado.
Revogam-se todas as pré-disposições em contrário (ou meramente discordantes!).
Fodília, Capital Oficial e Bacanal do Reino, aos 42 dias do mês de collorique, 5°. ano do Reinado em curso.
El Rei."
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EPÍLOGO:
E quase todos engoliram o sapo novamente, sub-vivendo infelizes para sempre. (Será???!!...)