PENINHA - Sabe, pode soar uma coisa ridícula...
ZÉ PEDRO - Faz uma introdução ali, Gerbase.
LULI - Mas ainda não tinha acabado a fita?
GERBASE - Essa aqui é a fita 3 da entrevista do Não com o Peninha Bueno.
ZÉ PEDRO - Mas então concluindo esse raciocínio todo sobre a cultura brasileira, realmente, na música, a única coisa que tu gosta mesmo no Brasil é dos Mamonas Assassinas?
PENINHA - Ahhhh, que pergunta maravilhosa! O Zé Pedro é o máximo! O Zé Pedro é... Zé, tu é do caralho. Sério, tou falando muito sério. Incrível...
ZÉ PEDRO - Como assim? Mas tu precisa dizer que tu tá falando muito sério pra verem que tu tá falando sério?
PENINHA - Tenho que dizer... Olha aqui: é que não dá, cara, eu não sei contar as histórias curtas... Eu nunca tinha ouvido os Mamonas Assassinas, entendeu, eu odiava os Mamonas Assassinas sem conhecer. É que... Sabe que o meu ego é uma mistura de alto bababá com, assim, eu conto umas histórias nas quais eu me espanco assim, né, eventualmente, tipo "mergulhou da tuberculose, Peninha?" E que eu acho que é uma espécie de querer bancar o anti-herói, deve ser isso, né, tem um, tem um processo psicológico. Mas de qualquer forma tem umas histórias nas quais eu poderia ser humilhado e que eu adoro contar, sabe, porque talvez elas possas significar alguma coisa pros outros, uma delas é essa. Eu nunca tinha ouvido os Mamonas Assassinas, entendeu, só eventualmente pela Flora, minha filha do meio, 15 anos, que, que o, que cresceu na época da Xuxa, então eu queria DAR NELA porque ela ouvia a Xuxa, DAR NELA! Quando eu via eu tava gritando: NÃO! NA MINHA CASA NÃO ENTRA A XUXA, quer dizer, uma coisa ridícula, eu proibia de fato.
JORGE - Abecedário eu acho interessante. (...) Abecedário, da Xuxa.
PENINHA - Ah. Pois é. É.
JORGE - Mas o resto...
PENINHA - Pois é, eu perdi, falei tanto que eu perdi todas essas observações inteligentes. Eu sou um fracasso mesmo. É verdade.
JORGE - E daí? E os Mamonas?
GIBA - E quando chegou nos Mamonas...
PENINHA - Nunca tinha ouvido, mas eu tinha aquela coisa assim: não ouvi e não gostei. Sabe, bá, uma bobagem, uma coisa... E o cara me ligou, oferecendo aí... o, pintou o lance aí, via Ivan e, e também depois um telefonema do Rick Bonadio, ahn, e um texto que eu mandei. E... daí pintou a oferta de grana. E eu peguei só pela grana. E depois, cara, me apaixonei total, não só pela história como pela música, sabe, eu ouvi um monte os CDs, assim, e bá, pirei total. Não pela música tanto em si, embora a produção desse Rick Bonadio... Porque daí ele me contou tudo, sabe? Olha, isso aqui foi gravado assim, assim, com um pedal...
ZÉ PEDRO - Mas é que, eu, um pouco o contrário, né, eu vou insistir num negócio.
PENINHA - É que os Mamonas não são brasileiros... Num lado eles são total, mesmo, porque eles são Macunaíma, eles são antropofágicos.
LULI - São brasileiros, total!
ZÉ PEDRO - Quer dizer, essas coisas, essas coisas universais de que tu fala...
PENINHA - O som não é tanto...
ZÉ PDERO - Tu que sempre diz que tu é um andarilho, que tu andou, né, nos Estados Unidos, etc, traduziu o "Pé na estrada", e tal... E aí tu fica falando da, da questão da, do fato de o Brasil lá fora, como é que, como é que é visto, eu já vi tu dizer isso outras vezes e tal... E uma das coisas que dá orgulho ao brasileiro, sempre, além do futebol, é a música brasileira, que é sempre muito bem vista lá fora.
PENINHA - É, é, é.
ZÉ PEDRO - E aí tu vem falar dos Mamonas Assassinos.
PENINHA - Tu vê. Os Mamonas Assassinas não são só música, né, os Mamonas Assassinas é uma história brasileira assim total, né? Não sei se algum de vocês leu o livro. Tu leu, né?
ZÉ PEDRO - Uns pedaços.
PENINHA - O livro é muito bom. O livro é muito bom. Muito bom. Ahn... O livro foi escrito em dezoito dias. Isso o torna, por um lado, melhor ainda. Pelo menos pra mim, assim, porque eu não sou daqueles... Se bem que eu não sei, sabe, tem aquela coisa... Será que é legal escrever tudo rápido, num jorro, e daí fica como fica? Ou é melhor ficar batendo punheta? Daí eu escrevo, lancei agora, essa semana, um livro sobre o descobrimento do Brasil, que eu achava DO CARALHO quando eu escrevi e agora reli e achei horrível. Horroroso, só vi os defeitos... Melhorou depois do quarto copo de vinho na segunda noite. Mas na primeira vez foi um horror. Agora esse dos Mamonas eu já li umas dez, doze vezes e é muito legal, sabe? Vocês têm obrigação de ler. É mesmo, é muito legal. E a história dos Mamonas é muito incrível, sabe? Muito incrível, e a vida deles é muito incrível, e isso tornou a música deles absolutamente incrível.
GERBASE - Como é que tá, como é que tá a história do filme, Peninha?
PENINHA - Dançou total, tá um rolo do caralho.
GERBASE - Deu uma confusão, né?
PENINHA - É, o Gugu Liberato entrou na parada também, e aí deu uma confusão...
JORGE - Olha aqui, e a... a Regina?
PENINHA - A Regina me ligou quando eu tava completamente fodido. Quando, quando, chegou assim, dois dias em que eu tive no auge do fodido. Num deles eu liguei para (...) , depois de ter ligado para outra pessoa que eu não direi o nome, e essa pessoa disse "ah, não posso emprestar, essas coisas..."
(trecho impublicável, em que o Peninha, como sempre, fala de sua conta bancária)
(risadas gerais)
PENINHA - Aí eu fui lá, peguei o Mercedes dele, peguei a mulher dele, peguei o rabo dele. Ele adorou tudo. O carro voltou melhor, a mulher voltou melhor, e o rabo ficou melhor. E eu sou muito grato.
JORGE - E a Regina, e a Regina?
PENINHA - Bom, então eu tive um dia de absoluta crise.
GERBASE - Vamos parar aqui, vamos parar aqui.
PENINHA - Aí, o (...) me emprestou o dinheiro. E não bastou. E aí eu vinha voltando pra rua, cara, uma sexta-feira, oito e meia da noite, na esquina da Bordini com a 24 de outubro, aí eu tinha três reais pra passar o fim de semana inteiro, e aí uma pinta completamente pobre, fodido, olhou pra mim, mandou uma energia incrível com os olhos e disse assim: "Tem algum dinheiro?" (dramático) Ele PRECISAVA daquele dinheiro, MUITO MAIS do que eu. E o meu coração bondoso DEU os únicos três reais que eu possuía.
JORGE - Os três? Podia ter dado dois...
PENINHA - É. Dei os três. Comovido. Dei cinco passos (isso foi na frente do Banrisul da esquina da, antes de chegar naquela Xavier Ferreira) e tocou o telefone. E era a Regina Casé. Necessitando dos meus serviços. E eu fui.
JORGE - Tu fizeste aquele de Portugal?
PENINHA - Eu fiz dois. Eu fiz o da França. Foi. Foi a seleção brasileira na França. Paris se preparando pra receber os brasileiros. E escrevi...
ZÉ PEDRO - Tu foi até a França?
PENINHA - Não. Nunca me convidaram. Gostaria de ter sido convidado, mas também não precisava, que eu já conhecia tudo...
JORGE - E o de Portugal?
PENINHA - E o de Portugal, do qual... Tu sabe como é que é o processo lá, né? É uma loucura, cada um escreve de um lado, ninguém se entende. E eu escrevi uns quatro roteiros, até um último ser aprovado. E deste meu, do Descobrimento do Brasil, que foi aprovado, entraram quatro cenas, que são muito boas. A da galinha, a primeira galinha do Brasil, essa cena é minha. A cena de subir na escada e dizer TERRA À VISTA com as pessoas treinando isso, cada uma tinha que dizer, "mas que terra à vista, você tá há quatro meses no mar, tem que dizer de outro jeito"... É minha. Ahn... A cena de como se fazia cocô e xixi a bordo de uma caravela é minha. E a cena de que...
ZÉ PEDRO - Mostraram no programa como se fazia cocô e xixi a bordo?
PENINHA - Porque ninguém nunca tinha pensado nisso...
(troca de fita)
PENINHA - Aí olhou e disse: "Tu nunca sofreu?" "É... Sofri um pouquinho." "Tá começando!"
JORGE - E ela no, no orelhão: "Quem fala?"
PENINHA - É MINHA! É minha! "Quem fala?" E ainda tinha outra. É minha! "Quem fala?" "Quem está falando é a senhora." E aí tinha um "Está lá?" "Não, estou cá!" E aí não botaram essa parte do está lá, estou cá. E a outra coisa minha, a última, são cinco, não são quatro, é a do... Sacadura Cabral, que veio de avião pra Brasil em 1926...
JORGE - Ah... E os caras perguntavam "que Cabral é este?"
PENINHA - Exato. Cabral foi de avião. Porque foi uma coisa muito grande em Portugal, em 1926, dois caras refizeram a viagem do Cabral de avião: o Sacadura Cabral e o Malheiro Dias. E aí ficaram mais famosos do que o Cabral em Portugal. Então a gente, porque aquilo é meio inventado, né, de que o Pedro Alvares Cabral...
GIBA - Totalmente inventado, né?
PENINHA - É. Bom, e no da França, cenas que são minhas... É o Leonardo tomando banho...
ZÉ PEDRO - Mas e qual é a história da Regina Casé ter te convidado? Tu continua lá?
PENINHA - Não, a minha nuvem negra fez com que acabasse o programa. O programa tava há seis anos no ar, mas onde eu ponho a mão...
ZÉ PEDRO - O programa acabou? O programa mais legal da TV brasileira acabou?
JORGE - Mas volta agora.
PENINHA - Mas volta como talk-show, né?
JORGE - É, uma mistura de talk-show com...
PENINHA - Bom, de qualquer forma, quando acabou foi horrível. Fiquei super mal na foto. Nunca tinha ficado mal assim por ter acabado uma coisa... Não, porque eu precisava daquela grana. Ahn, mas o... Ainda bem, pra mim, daí que acabou, de certa forma, porque... eu sou a fim é de escrever essas coisas de História, né, e agora que eu tou refazendo todas essa História do Brasil aí em CD-ROOM. Eu vou reescrever tudo...
GIBA - CD-ROM.
PENINHA - CD-ROM, é...
GIBA - Tu fala inglês pra caralho e vem dizer CD-ROOM. Pelo amor de deus...
PENINHA - É mal... QUE CONSTE EM ATA! Que conste em ata. De verdade, é vergonhoso mesmo. E é porque eu não sei nada de computador e se reflete até nisso.
GERBASE - Porque tu é usuário de Macintosh. Usuário de Macintosh é assim: tudo meio bicha.
PENINHA - É, mas como é bom, né cara, um milhão de vezes melhor...
LULI - Mas como é que tu vai ler a entrevista na Internet?
PENINHA - Ah, não... A Lúcia abre pra mim. Mas... Vai ser um CD-ROOM essa História do Brasil aí.
(risadas)
PENINHA - CD-ROM!
JORGE - Peninha, tu acha que o...
PENINHA - CD-ROOM!
JORGE - Eu fiz uma coisa em CD-ROM, a primeira coisa que eu fiz assim... E NINGUÉM LÊ, ninguém vê, ninguém ouve, ninguém fica nem sabendo. Tu acha que é uma mídia realmente interessante?
PENINHA - Não, mas é que cabe muito.
JORGE - Mas cabe muito assim... É...
ZÉ PEDRO - CD-RUIM.
JORGE - Cabe, mas tu usa? É muito chato.
PENINHA - É, nunca usei.
GERBASE - Eu uso enciclopédia, é muito bom.
LULI - Enciclopédia, claro, pras crianças é maravilhoso.
JORGE - Mas a enciclopédia impressa é mais rápida, né?
LULI - Não, pra imprimir, elas pedem... Imprime uma foto, de não sei o quê...
ZÉ PEDRO - Mas a Internet é mais fácil que CD-ROOM. Não tem que ficar aplicando em cada CD-ROOM...
GIBA - Tu insiste no CD-ROOM, hein?
(risadas)
PENINHA - Eu não sei nem o que quer dizer ROM, cara. O que quer dizer?
GIBA - Read-Only Memory. Porque tem a Random Access Memory, que é a memória que...
PENINHA - Tu viu aquele documentário sobre a história do computador daquele cara da Wired? Na GNT? Como é bom a GNT...
LULI - Alguém viu aquele..."Fires of Kuwait"?
PENINHA - Puta que o pariu...
LULI - Onde é que tu viu?
PENINHA - Não sei, é do National Geographic, né? Acho que eu vi na GNT.
JORGE - E o documentário sobre os cruzados, do cara do Monty Python aquele?
PENINHA - É... Que coisa maravilhosa, né? Esse meu livro sobre o descobrimento do Brasil tem umas coisas bem legais. Mas é o seguinte: como eu quero fazer propaganda de mim, eu escrevi um livro... Se bem que eu achava bem legal esse, do Descobrimento do Brasil. Aí quando saiu eu só vi os defeitos, achei meio ruim, mas tem muita coisa boa. Claro que vocês não vão ler, porque vocês não têm saco. O Zé Pedro, principalmente, que eu gostaria que lesse, e não leu nem os Mamonas. Mas eu acho um absurdo vocês não lerem os Mamonas, embora, claro, não seja absurdo porque vocês têm muita coisa que fazer. Mas é muito legal. Cara, os Mamonas, e foi feito pra ser um filme, né? Mas isso que eu falei sobre o Descobrimento do Brasil que ficou meio chato. Ficou tipo assim a entrevista, sabe, eu falei demais. Tinha coisa demais. Eu queria contar tudo, com todos os detalhes, não dá! Porque tem que editar. Embora... Quer dizer, se tu conseguir o equilíbrio entre contar tudo, com todos os detalhes e manter o fio da meada... do caralho! Mas é muito difícil. Então é mais fácil tu editar e contar só as coisas boas. Como num filme do Jorge Furtado. Que é o Ilha das Flores. Ele tentou contar toda a História da humanidade num filme de quantos minutos, Jorge?
(o Jorge está mexendo num micro ligado na rede; de repente, aparece o "portal de entrada" do NÃO editado pela Luli)
GERBASE - Deixa eu deixar registrado aqui que muita gente me reclamou que não conseguia entrar no Não...
LULI - Muita gente! Mulheres, principalmente...
JORGE - Eu não quero registrar isso.
GERBASE - ... Por causa dessa tela... É, o Jorge tá apresentando ali a tela do Não, que tem que clicar na mãozinha ao contrário. Isso é muito complicado.
JORGE - O problema é o seguinte: mulheres...
GIBA - Sabe qual é o problema, Jorge? A tua tela é 800x600. Na minha tela, que é 640x480, a única mãozinha que tá na direção errada fica ABAIXO da linha... Ninguém enxerga.
LULI - Aí, sim!
JORGE - Pra entrar no Não, tem que clicar ali, ó!
ZÉ PEDRO - A idéia é do caralho, é absolutamente do caralho. Agora, só funciona na tela de 800x600.
LULI - Só que as pessoas não conseguem entrar.
ZÉ PEDRO - Não, mas é melhor ainda na tua tela. Porque, além de a mãozinha estar ao contrário, ela não aparece! O cara tem que baixar...
JORGE - Este aqui é o Não 55, editado pela Luli... Editorial, Polêmica, Comédia, Poesia...
PENINHA - Puta, que legal, cara!
ZÉ PEDRO - E eu quero declarar uma coisa aqui...
LULI - Olha ali quantos já leram.
JORGE - 2333 entradas!
ZÉ PEDRO - Quantas garotas que dizem não já apareceram?
GERBASE - Três.
JORGE - E aqui tem um seção chamada "Não era assim"...
ZÉ PEDRO - Três?
JORGE - ... que é como era o Não na época em que era um jornal manuscrito.
GERBASE - O que tu quer declarar, Zé Pedro?
JORGE - ... Então tu pode ver aqui, com fac-símiles...
ZÉ PEDRO - Nada. Depois a gente fala.
JORGE - ... Aqui temos por exemplo a capa do Não 42...
(risadas do Gerbase. Fim da fita. Fim da entrevista. Seguiram-se mais duas horas de conversa, que não foi gravada, o que é uma pena, porque foi aí que o Peninha se soltou de verdade)