A seguir, apresento uma dessas histórias abortadas
- poderia ser um conto ou o roteiro de um curta, mas acabou virando apenas
um breve argumento interrompido, escrito na forma de diálogos. Fica
assim a história incompleta, com seus personagens à procura
de um novo autor. Quem sabe alguém se anima a continuá-la?
Aceito sugestões.
CENA 1
- Olá...
- Oi.
- Eu vim... Bom, eu tô com esse problema... Sabe como é...
- Claro que sei, rapaz. Dá pra ver na sua cara, ou melhor, na sua testa. Calvície prematura. Hahaha.
- É...
- Não te preocupa, meu caro. Nós temos a solução.
- Pois é... Vem cá... Esse negócio de Calendário Lunar funciona mesmo?
- Se funciona? Se funciona? Rapaz! Olha pra mim! Olha pra mim! Eu tenho quarenta e nove anos, rapaz. Quarenta e nove! E olha os meus cabelos!
- Ahn... O senhor não vai levar a mal, mas pra mim isso parece mais uma peruca, e daquelas bem fajutas...
- Hmm... Ora.. Pois é, é uma peruca! E daí? E daí, porra?!? O sistema funciona em 90% dos casos, é só que às vezes há incompatibilidade genética, como é o meu caso. Até hoje, dos clientes, nenhum reclamou. Olha aqui, tá vendo essa foto do sujeito ali? Ator da Globo! Ele se tratou aqui. Olha só como ele era antes... Vai dizer que isso é peruca também, vai?
- Puxa... É, mas como é que eu sei que isso não é truque fotográfico? Hoje, com o Photoshop...
- Escuta, seu merda, você vai querer ou não vai? Tem uma fila de clientes atrás de você, se não quer, SE MANDA!
- Tudo bem... Tudo bem, eu vou querer.
- Beleza. Assina o aqui. E aqui. E nesta outra via também.
- Como... como funciona o esquema?
- Ah, cortes programados a cada lua cheia. Assina aqui também. Isso, rapaz...
CENA 2
- Seu filho da puta!
- Que é isso, rapaz! Que foi agora?
- Olha pra mim! Olha pra mim!
- Tô vendo. Você tá bem mais cabeludo do que da última vez. Não ficou satisfeito? Quer mais?
- Seu merda! Não dá pra ver?
- Ver o quê?
- Eu virei um lobisomem, seu puto!!
- Ah... Bem que eu notei que era pêlo demais. Bom, você não pode reclamar. Estava no contrato.
- Como é que é?!?
- Estava no contrato que você assinou. Olha aqui, tá nas letrinhas pequenas, pega a lupa pra ver melhor: "a empresa não se responsabiliza caso o cliente, por motivos de incompatibilidade genética ao tratamento, vir a sofrer de lupomorfose, vulgo, 'virar lobisomem'". Quem mandou não ler, otário? Hahahah.
- Merda... Merda, o que vou fazer! Eu quero meu dinheiro de volta!
- Dinheiro de volta o cacete! Te manda, rapaz. Fica feliz,você nunca mais vai ter problema com queda de cabelo! Hahaha.
- Seu palhaço! Me dá o meu dinheiro! Me dá!
- Quietinho aí! Nem um passo mais! Tá vendo isso aqui? Não é um revólver normal, não. Está carregado com balas de prata. De prata, rapaz! Dá mais um passo e eu te mando pro inferno!
- Grrr... Grrauf.... Grnhnhhhannerrghf!!!
- Isso... Vai te embora... E não volta mais aqui!
CENA 3
- Oi, querid...
- AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH!!!!!
- Calma, querida, sou eu mesmo. Eu fiz um tratamento contra a queda de cabelo, e...
- Porra... Que tratamento, hein?
- Pois é, acabou sendo excessivo... Virei um lobisomem.
- ...
- Merda, né?
- Bom...
- O quê? Você acha que eu devia processar os filhos da puta?
- Não sei... Eu.. Pra falar a verdade, eu gosto de homens peludos... Sempre me deram um tremendo tesão... Quando era adolescente, eu tinha sonhos eróticos com o Tony Ramos.
- Caramba...
- Vem. Vamos trepar.
- Agora?
- Agora! Vem... Vem!!!!
- Grrauf...
CENA 4
- Hmm.. Até que foi bom, não foi?
- Bom? Bom?!? Amor, foi a melhor noite da minha vida... Você virou um animal, literalmente...
- É...
- Aliás, vou te confessar uma coisa... Foi a primeira vez, desde que casamos, que eu...
- Não! A primeira...?
- Arrã.
- Putz.
- Foi uma coisa tão selvagem, tão... Deus, foi como trepar com um cachorro!
- Você já trepou com um cachorro?!?
- Er.. Eu... Eu quis dizer, foi como eu IMAGINO que seja trepar com um cachorro. Você entende.
- ...
(Aqui a história se interrompe. Há duas
alternativas possíveis: ou o infeliz aceita seu destino de lobisomem
e se conforma à nova situação, como a tantas outras
coisas, ou simplesmente se recusa a viver essa nova natureza, tentando
o possível para voltar ao seu estado anterior. De qualquer modo,
me pareceu que a partir deste ponto a piada começava a perder a
graça, e o "plot" necessitava de uma reviravolta para manter o interesse
do leitor/espectador. Como não se me ocorreu nada, ficou tudo pela
metade. Chato, mas fazer o quê. Algum dia eu termino.)
Tomás Creus
tomas@cpovo.net