PRA FICAR TUDO JÓIA RARA:
MINHA INICIAÇÃO EM NUMEROLOGIA
 
por Giba Assis Brasil
giba@portoweb.com.br
 
 
Sim, eu realmente derrubei uma árvore (pra ser mais preciso, um eucalipto de 11 metros de altura) sobre minha barriga, como disse o Jorge, "apenas com o poder da mente". Sim, eu fui a única testemunha de uma experiência de
comunicação telepática entre os irmãos Heinz e a Liza Minelli durante um campeonato de botão. Sim, no meu caso faltou luz no momento exato em que a ratazana encurralada que saltara na minha direção atingiu o ponto mais
elevado de sua trajetória, na altura dos meus olhos, a meio metro de distância. Não, eu nunca tomei Daime nem li Castañeda, e não estava bêbado em nenhuma dessas ocasiões. Sim, ao contrário do que possa parecer, o meu
interesse pela numerologia e outras ciências ocultas vem de longa data.
 
Em 1980, eu trabalhava como "auxiliar de plantão esportivo" na Rádio Gaúcha - e, graças ao meu chefe Raul Moreau, era conhecido, entre as 23 pessoas que tinham interesse e paciência para ouvir o encerramento das jornadas, como "Giba Matemático". Nesta época, encontrei, numa banca de revistas, o livro que mudou a minha vida. Trata-se de "Numerologia", de "Kalmitz, g.r.p."
 
O livro não tem data, nem editor responsável, apenas uma Caixa Postal em Porto Alegre para "pedidos" (10271, mas eu não arriscaria). Não há também qualquer explicação para o misterioso g.r.p. colocado após o sobrenome do autor: seriam suas iniciais, em minúsculas como as de e.e.cummings? ou quem sabe um título honorífico: "grande recebedor de prêmios" ou "genial revelador dos processos"? ou, mais provável, uma previsão cifrada: "ganhará reconhecimento póstumo"?
 
Mas o livro tem um subtítulo, "Como ganhar nas loterias: Federal, Estadual, Guanabara, Paraná, Uruguay". E mais, ainda na capa: "Loto" e, depois da ilustração de uma roleta, "As invertidas: 3-4-8, 3-9-4, 6-9-4 e 4-5-9-6". Não preciso dizer que, mesmo não tendo nenhum interesse em jogar em qualquer loteria, fiquei fascinado por estas combinações de números, que deveriam estar ali por algum motivo, o qual me escapava. Fiquei me perguntando se
deveria comprar o livro (na época, minha bibliofilia era limitada pelo salário da RBS), até que encontrei, na contracapa, um texto esclarecedor. Aqui, como nas citações posteriores, manterei a pontuação e a grafia maiúsculas/minúsculas do autor, tão interessantes quanto o resto:
 
"Acontece que, o numerologista, como a roleta se destinava ao desafio da aposta, colocou, no pano, um visual acorrentado aos princípios de todos conhecidos mas, no campo atingido pelo círculo da circunferência, entre os
números não ordenados, usou a teoria dos números NÃO COMPATÍVEIS." Em seguida: "o autor" e uma assinatura indecifrável.
 
Não se preocupem: é claro que se trata de um parágrafo pinçado de um texto maior. Mas a grande questão era, e continua sendo: por que colocar exatamente este parágrafo na contracapa? De qualquer forma, eu li o livro todo (na época eu tinha tempo pra isso) e posso assegurar que, em seu devido contexto, o parágrafo permanece, digamos, tão "aberto a significados" quanto no caso de ser lido isoladamente. O livro não esclarece o que seja um "visual acorrentado" ou a "teoria dos números não compatíveis" (quem sabe material para um novo volume) ou mesmo de que círculo e de que circunferência se tratam. Mistérios da numerologia humana.
 
Comprei o livro. E o cara da banca ainda perguntou se eu não queria também jogar no bicho.
 
Das 140 páginas, mais de 90 são tabelas com números indicados para jogar nas diversas loterias. Por exemplo: se você sonhou com o número 58 e quer jogar na Loteria do Paraná, do primeiro ao terceiro prêmio, então compre bilhetes terminados em 058, 258 ou 458 - nunca 158, 358 ou etc; na Loteria Federal, as dezenas com final 4 que mais ocorrem do 2º ao 5º prêmio são 14, 24, 54, 74 e 84; na Loto, "como em todos os sorteios de baixa numeração, prevalecem as dezenas abaixo de cinqüenta."
 
Mas o melhor mesmo é a parte, digamos, teórica do livro. Ao longo de vários capítulos, dispostos segundo uma metodologia na qual até hoje ainda não fui iniciado, temos algumas pérolas do pensamento pós-moderno, como a que segue:

"Temos convivido, há alguns anos, entre as mais ousadas tentativas que, através da numerologia, nos pareceram, sempre, uma 'táboa de salvação' e, por esse poder, vibratório e extraordinário, de força incontestável, conseguimos inúmeras e favorecidas facetas em nossa existência. Felizmente, aos poucos, os números como ciência e certos ângulos da ciência como números, estão a caminho dos chamados intelectuais pois, em breve, os números, como outras ciências, revelar-se-ão o percurso mais EXATO na opção por maioria." (p. 8)
 
Viram só, "chamados intelectuais"? Começam a entender o que está acontecendo no mundo, e que a vossa vã filosofia não foi capaz de prever? Mas tem mais:

"Todas as ciências estão nos números e, por números, serão todas as decifrações que forem alcançadas. Os NÚMEROS do matemático, ao cabo de um todo, chegarão à incóginta; os do físico, não deverão encontrar a materialização dos seus eventos e, os do químico, por conseqüência, não terão a probabilidade da análise. TUDO SERÁ O COMEÇO: o mesmo que, até hoje, aí está dado pelo MESTRE que, pelo seu discípulo e verdadeiro seguidor, FEZ COM QUE OS HOMENS, materializados, palpáveis no seu todo, fossem justificados mas, carregados da IMPERFEIÇÃO; no entanto, depositários de intermináveis forças magnéticas, propulsoras das mais originais tendências do BEM e do MAL." (p. 8)
 
Perceberam? Magnetismo, ação à distância, a força que a gente não vê mas que faz cair a bolinha certa no sorteio, e a mulher da tua vida aparecer justamente naquela festa, e no seu período fértil. Nada é por acaso, OK, tudo estava escrito ou, como diz a tia Margarida, "as coisas só acontecem quando têm que acontecer". Só que eu ainda não entendi por que é que o Jorge Ben teve que trocar de nome.
 
Ah, mas o Kalmitz, g.r.p. explica:
 
"Os nomes, os apelidos, as repetições, são um todo, em numerologia, como a LEI DA RELATIVIDADE e, por estimativa numerológica, uma força que não é conveniente ao desafio, à brincadeira. Vejamos, pois, como alguns NUNOS de
pessoas, fatos, envolvimentos, etc. os coloca no mesmo PLANO, naturalmente, com pequenas e mínimas diferenciações: BRASIL = 12 = 3 = (1500 + 3) = 18 = 9 = (JESUS) = 18 = 9. Aí está nossa PÁTRIA na simbologia numérica e, por tudo, vivenciando o sacrifício pelo princípio mas que, sempre há de sair-se como força vencedora e agressiva pela convicção 21/abril = 9/1500 = (3 + 9 + 6) = 18 = 9, em número e verdade, a contagem de JESUS = 9, NOVE!" (p. 26-27)
 
Entenderam? Não ficou perfeitamente claro? Agora preparem-se para a revelação final:
 
"PAPA = 8 + 1 + 8 + 1 = 9 e veja-se a influência do NOVE para que se chegue a PAPA ou para que se chegue ao fim de um todo; CHICO XAVIER = 39 = 12 = 3 e que está para ESPIRITISMO = 39 = 12 = 3, estando, também para o APOCALIPSE = 39 = 12 = 3. A expressão vocabular representa a potência numerológica ou a vibração idêntica no entanto, relativamente, a cada SETOR DE VIVÊNCIA DESSES NUNOS ou isto: cada um colocado à altura de suas atividades conhecidas. PELÉ = 21 = 3, examine-se aqui, agora o ponto do nascer do 3! ROBERTO = 29 = 11 CARLOS = 19 = 10 = 1 = (11 + 1) = 3. Portanto, Pelé está para Roberto Carlos, como Roberto Carlos, nas proporções, está para Pelé. GARRINCHA, como era conhecido. E o CINCO foi, na sua vida, o verdadeiro Garrincha que a expressão do povo o titulou. Veja-se o que é o CINCO. FITIPALDI = 31 = 4 (felizmente, cercado por outro quatro mas, sempre será o único (mas), o egocentrismo e o descanso à sua espera. CASTELO BRANCO = 46 = 10 = 1; COSTA E SILVA = 37 = 10 = 1; DELFIM NETO = 46 = 10 = 1; FIGUEIREDO = 42 = 6 ao Brasil de 1500 = 6, nunos em confronto, em um novo COMEÇO, veja-se quem é o SEIS, !"
 
(É assim mesmo: vírgula, espaço, ponto de exclamação. Nova linha.)
 
"Graças a esse SEIS o Brasil que é o NOVE, terá somado ainda um SEIS, para que ninguém, de outra forma, queira assinalar seus pontos. Examinem, raciocinem e, mais uma vez, os números se aproximam..." (p.27)

"Concluindo: Contando-se o demissionário, que estava no período (1963) e tomando o ano de 1964, estamos como o SEXTO presidente. Agora, vejamos o porque das modificações: 1937 = 20 = 2 = 1946 = 20 = 2 = 1982 = 20 = 2 e
que, o cômputo dos fatos, provavelmente, sejam realidades que a história tem para mostrar. Nunca devemos esquecer que também 1964 = 20 = 2." (p. 28)
 
Viram por que eu disse que este livro mudou a minha vida? "O cômputo dos fatos provavelmente sejam realidades que a história tem pra mostrar." Se isso não é ODARA, então eu sou o Paulo Coelho.