Três vezes, não!
por Daniel Cassol
O atacante Palermo, da seleção argentina, entrou para história do futebol no domingo do dia 4 de Julho, no jogo contra a Colômbia pela Copa América. Infelizmente, com um recorde negativo. Foi ele o primeiro jogador de toda a era futebolística a cobrar três penalidades numa só partida e errar as três. Bateu a primeira no travessão; a segunda, quase para fora do estádio e a terceira foi tão ruim que o goleiro mal teve de se mover para espalmar a bola. Dou mais um século de futebol e ninguém consegue repetir essa façanha, não mesmo.
Não entendo como não houve nenhum outro jogador, nem o treinador, nem mesmo a torcida, que impedisse pelo menos a terceira cobrança. Todos deveriam saber que isso só prejudicaria a imagem do atacante, ou sua credibilidade, para usar um termo atual, mas ninguém teve coragem de dizer, três vezes não Palermo! O problema é que Palermo é um grande craque do futebol argentino, goleador do campeonato nacional pelo Boca Juniors, com o passe altamente valorizado. Deve ter sido por isso que deixaram-no cobrar a terceira. Deu no que deu.
O futebol pode nos ensinar várias lições. Por isso eu fico pensando por que não houve quem impedisse mais um erro, será que por respeito ao atleta ou por medo de outro cobrador? Aqui no Brasil, se olharmos bem, veremos exemplos iguais ao que o centroavante argentino nos proporcionou.
Como Palermo, nosso atual presidente também é um homem respeitado por suas virtudes e por sua história. Fernando Henrique é um sociólogo de renome internacional, que lutou contra a ditadura militar e que, um dia, já foi capaz de externar sua revolta contra a submissão do Brasil frente aos interesses dos grandes mercados mundiais. Pena é que, como todos os craques de nosso país, há muito já teve seu passe vendido para os clubes do exterior. FH joga hoje para o Sport Club FMI.
Fernando Henrique já teve duas penalidades para cobrar, errou as duas. Na primeira, a torcida pediu FH para a cobrança, gritou seu nome, mas ele deu um bico para fora. Na Segunda, demos outra chance, afinal ele é um craque, desta vez ele iria acertar, mas na verdade ele está se mostrando um péssimo cobrador de penalidades. Como Palermo, FH errou feio, deu um chutão para fora, mais precisamente na direção da Europa e dos Estados Unidos. A torcida pagou caro o ingresso, cujo preço já deve ter subido, sentou numa arquibancada fria, sem nem um pão com salsicha amanhecido para comer e viu o seu ídolo de terno e gravata, correr para bola e, de perna direita, despachar para longe a bola e as esperanças dos brasileiros.
FH está perdendo a credibilidade da mesma forma que Palermo perdeu a sua. Mas o centroavante argentino deve ter sentido vergonha,ou algo assim, e seu técnico já deve ter dado um puxão de orelha no jogador e estabelecido que, daqui por diante, quem bate o pênalti é outro. Mas parece que o jogo que o presidente joga tem as regras viradas ao avesso. Parece que a derrota conta pontos e vence quem consegue chutar o Brasil o mais longe possível. E o treinador Antônio Carlos Magalhães, a quem Fernando Henrique obedece cegamente, não demonstra estar muito interessado que o presidente acerte as cobranças.
E enquanto o torcedor deixa o estádio aos 40 do segundo tempo de cabeça baixa, com vergonha de olhar nos olhos dos ricos, segue a festa dos craques do colarinho branco. Daqui a mais alguns anos, outro brasileiro vai cair de fome dentro da grande área e FH vai querer bater o pênalti novamente. Ou então vão fabricar outro craque, que aparecerá no Jornal Nacional fazendo firulas com uma bola importada, e prometerá balançar a rede desta vez.
Está certo que, até lá, nossa imensa torcida não vai ter dinheiro para comprar os ingressos e, passivamente, assistirá à exibição dos craques do Sport Club FMI pela tela de uma televisão comprada nos áureos tempos do Real, com a narração de Roberto Marinho impondo a todos que o Brasil ainda tem o que comemorar. Tenho vontade de me jogar num poço fundo com uma pedra de obra amarrada na perna quando penso na possibilidade de não aparecer ninguém para tomar a bola da mão de FH e assumir a cobrança, só que agora com o pé esquerdo. Quem sabe ainda nos resta uma prorrogação de morte súbita, quando a terceira penalidade acontecer. Quem sabe surja um craque canhoto, acompanhado do grito ensurdecedor de nossa torcida, pegue a bola e diga, definitivamente, três vezes não, Fernando Henrique!
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