Regras para bem se portar em vernissages, noite de autógrafos e estréias de filmes.
de José Roberto Torero
É muito importante saber como se portar nos lugares públicos. Não é aconselhável lamber o prato depois de tomar a sopa, é pouco polido pedir garfo e faca para comer um sushi e arrotos só em lugares e circunstâncias específicas. As boas maneiras são necessárias à boa convivência e não devem ser desprezadas. Mas elas não existem apenas em relação à mesa. Por isso, a fim de ajudar aqueles que vão às vernissagens, aos lançamentos de livros e às estréias de filmes, coloco aqui algumas regras de boas maneiras para estes momentos.
I Do que falar
É muito importante, caro leitor, saber o que falar nestas ocasiões. A regra básica é evitar os assuntos mais interessantes, como os chutes do Marcelinho, a careca do Ronaldinho ou sexo bizarro. Para não haver perigo de errar, o melhor é falar dos filmes que estão em cartaz, de preferência os que estão no Espaço Unibanco.
II Do que vestir
Neste quesito não há o que inventar: os rapazes, blazer xadrez, as moças, roupas pretas.
III Do que beber
Nestas ocasiões há sempre poucas opções e a desculpa dos organizadores é que trata-se de um evento cultural e não gastronômico, como se o cérebro funcionasse sem comida. E, além de serem poucas, as opções não são boas. Esteve em moda há pouco tempo o vinho branco licoroso alemão, aquele da garrafa azul. É aconselhável evitá-lo. Trata-se de um veneno para o fígado e o estômago, e já foram registrados até casos de morte em ingestões acima de meia garrafa. É melhor ficar nas outras duas opções, o vinho branco (sempre bom para aqueles que têm intestinos tímidos) e o uísque (uma forma de integração com nosso irmão de Mercosul, o Paraguai).
IV Do quanto beber
Os abstêmios não têm vez em vernissages, estréias e lançamentos. Primeiro porque ter um copo na mão dá um certo ar de inteligência, depois, pois segurar um copo é sempre alguma coisa para fazermos com as mãos. Porém, é bom evitar o excesso, porque o vômito não combina com estas situações (a não ser em uma ou outra vernissage, quando podem passar despercebidos por ser confundido com algum quadro).
V Do que comer
Corre o boato de que os canapés de eventos culturais são feitos com rabos de lagartixa, olhos de mosca e pernas de barata, mas tal afirmação é infundada. Pelo menos em relação aos olhos de mosca. Por via das dúvidas, jante antes.
VI Das cantadas
Esses eventos sempre juntam pessoas com afinidades culturais, logo, sempre pode surgir a oportunidade de um flerte ou de uma, como se dizia no meu tempo, paquera. No caso de você sentir-se animado a atacar, o mais apropriado é começar uma conversa mais intelectualizada mas com humor, como por exemplo "Gosto mesmo é de cubismo", "Não diga!", "É, até comprei um cubo mágico."
VII Dos comentários sobre o autor (para terceiros)
O interessante neste momento é afetar intimidade com o astro da noite. Diga coisas como "Sabe que eu li o livro antes de todo mundo", ou "Ele estava tão duro há um tempo atrás que teve que pedir meus pincéis emprestados." ou ainda "O diretor teve idéia desse filme quando eu e ele estávamos jogando uma partida de buraco, acredita!?"
VIII Dos comentários sobre o autor (para o autor)
Elogie, é claro. Se não souber como, consulte o item "X".
IX Das horas em que se deve chegar
Vai-se a esses lugares também para ser visto. Portanto, é sempre bom chegar cedo para que todos possam vê-lo. Outra boa tática (principalmente se você for concorrente do dono da festa) é chagar quase no fim do evento. Nesse caso, cumprimente a todos (para que todos saibam que você veio) mas sempre comente "Rapaz, eu estava tão cheio de coisas para fazer que quase não vim."
X De como tecer os comentários sobre a obra para o próprio autor
Essa é a parte mais difícil. O escritor (ou cineasta, ou artista plástico) está sedento de elogios e se você foi ao evento é porque de alguma forma você gosta dele e, se você gosta dele de alguma forma, é sua obrigação fazer um elogio. Porém, há vezes em que a obra não merece grandes louvores, apesar de o dono da festa ser seu amigo e ótima pessoa. Nessa situação, a saída é exaltar alguma característica lateral da obra, dizendo coisas como "as molduras estão ótimas!" ou "o cartaz do filme é uma beleza!".