por ariela
boaventura,
mary jane parker interina
Ele é enredado, mas é bom. Só acho um saco aquela roupa colante que usa. Deixa um cheiro esquisito de aracnídeo na pele dele.
Ninguém sabe, mas o Homem-Aranha é míope e usa meias de lã.
Na primeira noite em que, ousado, entrou por minha janela, sorrateiro
como um gato, só fui notar sua presença ao amanhecer, quando
puxei o cobertor e senti certa resistência.
Puxei com mais força, ainda sem abrir os olhos, em vão.
Sobressaltei então quando senti que o cobertor correra novamente
de cima de mim, como bicho vivo.
Sentei, olhos agora bem abertos. Olhei para o lado direito da cama.
Havia, enrodilhado em meu cobertor, uma criatura masculina imensa,
dormindo de costas. Não roncava, mas tinha uns tiques nos músculos
de quando em vez, como que a sonhar com uma briga.
Levantei e coloquei as pantufas, tentando lembrar o que tinha feito
na noite anterior. Talvez, pensava, coçando a cabeça, tivesse
bebido demais por aí e trazido sabe lá quem para minha cama.
No chão, vi uma roupa de lycra ridícula para o tamanho
do homem. Peguei-a, olhei melhor: havia o símbolo de uma aranha
ao centro do peito do que parecia uma macacão vermelho com azul.
Ironicamente, eu havia desistido de ir a uma rave na noite anterior. Enquanto me enrosacava em pensamentos, tentando racionalizar a situação, ele se mexeu. Fiquei imóvel como uma criança que está fazendo arte. Ele rosnou algo em inglês. Meu deus, pensei, colocando a mão à boca, ou estou tendo alucinações devido ao Tegretol ou eu saí e bebi tanto ontem que não tenho nem flashbacks!
Cheguei mais perto do homem, com cuidado. Belo espécime de mais ou menos 28, 30 anos, pela ruga em cenho, algo de expressão. Havia remela nos olhos. Percorri toda a extensão de quem ocupava a cama quase inteira. Grandão. Daí ele abriu um olho: azul.
Desmaiei.
Acordei com Peter apavorado, borrifando água gelada em minha cara. Me encolhi toda, logo que me dei conta de que estava em calcinha e sutiã: ora bolas, o que eu ia dizer a ele?
- Oi.
- Rái. Áim Peter. Uats iôur nêime?
- Simone. I don't speak english.
- Hum... yo hablo español, francés y latim thardio, y um phouco de porthugués.
Daí me explicou toda a noite anterior, como entrou pela janela, porquê, quem era, etc. Ofereci uma torrada de queijo, café e cigarros.
O Homem-Aranha aceitou tudo e perguntou se poderia passar uns dias em minha casa.
- A redaçáo lá em Amêrica tem muitho er.. pó. Y eu teño rinite. Enthente?
- Si, como no.
Daí me beijou só como um super-herói poderia beijar. Então, pouco depois do agarra-aqui-e-ali, eu vi.
Vi um emaranhado de músculos que chegava a assustar. Falamos seriamente sobre isso depois. Sim,depois da supertrepada. Não vou dar detalhes. Só posso dizer que a saliva do Homem-Aranha é branca como leite, pegajosa e doce. Ele falou - e demonstrou - que em contato com o oxigênio ela endurecia, para fazer teias. Não consegui deixar de associar a saliva dele com o líquido branco aquele que se esparrama quando esmagamos uma barata. Mas ele tinha outros tipos de teia mais resistentes. Perguntei se cuspia nas mãos para fazê-las, pois que dali saiam. Oh, meu deus, um cara babão, pensei, mas Peter disse que eram espontâneas e saíam simplesmente do meio de suas enormes e habilidosas mãos na hora em que a adrenalina subia. Essas teias eram super-resistentes, tipo náilon.
Foi com uma destas teias que ele me atacou quando nos estapeamos na última noite. O Homem-Aranha quando furioso fica histérico e tentou me matar com uma teia destas de náilon. A discussão acalorada era sobre seu emaranhado de músculos, coisa que acho esteticamente de muito mau-gosto. A única explicação que me deu, antes de me deixar presa numa teia gosmenta, é que eram músculos do ofício. E que voltaria qualquer hora, se eu deixasse a janela aberta.
- Gostho de mulher briguenta -, disse, sorrindo. E saiu por onde entrou. Esqueceu lá em casa uma horrenda cueca verde e o par de meias de lã: ele volta.
Meu travesseiro amanheceu hoje com uma mancha esbranquecida e dura: o Homem-Aranha baba quando dorme.
Ejacula teia aqui pra
voltar pro NÃO