FESTIVAL ARTHUR DE FARIA DE TEXTOS INDECOROSOS QUE FARIAM MAMÃE CORAR

Uma seção com a mais fina flor das composições de Arthur de Faria.

Seleção do próprio autor.

 

 

Aura

E tu, minha bela, descansando nua
Luze os postes, luze à lua
Tonta, branca, meu amor
Só teu langor me encanta
Tua lassidão de planta
Cheia e murcha.

Se galos suburbanos recorrentes
Se cigarros que tu fumas
Não me deixam entender
Que faço quando eu falo
E me respondes
A quilômetros dali?

...

Estala na vitrola
Um velho brasileiro
Antônio, conselheiro,
De mim nesta canção

 

Necessidade é a Mãe

Você acha realmente que podemos ser amigos?
Você acha realmente que precisamos ser amigos?
Você acha mesmo que temos a sincera obrigação de ser amigos?

Você acha por acaso que entre nossos ouvidos e bocas
Possa haver alguma coisa que não dentes, língua, saliva?
Você acha na verdade que temos alguma coisa
Além do sexo construída?

Você acha por acaso que entre nossas bocas há um nexo que, só, negue a necessidade de meu sexo em tua boca?
Você acha a vida pouca?

Você acha realmente que precisamos ser amigos
Entre a morte dos amantes e a separação dos vivos?
Há alguma vã verdade em celebrar os tempos idos?
Ora, tenhamos respeito ao sentido, havido e tido!

Que teremos entre nós?
Que teremos de ruídos?
Ou você acha realmente que teremos silêncios de amigos?

Você acha por acaso que temos em comum algum gosto
Além do meu e do seu na boca do sexo oposto?
Você acha em verdade que o que melhor sai de minha boca em direção ao seu ouvido é antes uma língua lúbrica que uma vontade e um não tido?
Você vê na amizade algum sentido?
Você acha por acaso que entre nossos ouvidos e bocas
Possa haver alguma coisa que não dentes, língua, saliva?
Você acha na verdade que temos alguma coisa
Além do sexo construída?

Que teremos entre nós?
Que teremos de ruídos?
Ou você acha realmente que teremos silêncios de amigos?

 

Oito de Março

Aperto a tua mão e, horas depois, inda sinto na minha o teu cheiro.
Aperto tua mão e, horas depois, o teu cheiro.
Que coisa tátil é essa que me remete a tantos gostos e graças?
Que ritual herege teu tato que traz de volta a viva paixão enterrada?

Aperto tua mão e, muitas horas depois, procuro em vão teu miasma.
Aperto tua mão e, horas depois, teu miasma.
Agora já não estás ali, é tarde. Resta o vago monstro redesperto, resta a transparente medusa de esperas.
Minhas cem mil cabeças expectam por ti, meus desejos-hidra crescem todos de volta dos jazidos pescoços inertes para reterem-te em teu cheiro.

Apertei a tua mão e eras tu, ali. Olorosa oferenda.
Apertei a tua mão e eras tu, ali. Oferenda.
Apertei a tua mão e eras de novo olhos e boca e peitos e branco e pernas e sexo.
Dentes e língua.
Tua mais profunda pele.

Apertei a tua mão e, nela, todos os cheiros do desejo no teu cheiro de novo estavam.
Apertei a tua mão e, nela, todos os cheiros estavam.
Apertei
Tua mão
E, de novo,
Te quis.

(Dona Chica dimirou-se-se-se de que houvesse uma paixão tão
        grande assim...)


Putaqueopariucaralhoporra!

Eu queria em ti o que era literário em ti
Um grande amor que não podias dar-me
Ausências e seduções incompatíveis a tua pessoa
        plana
        lisa
        rasa
        vã
O único em ti espesso e em que eu feliz mergulhava eram teus vãos
Tensos
Esses sim, me esperavam feito louco espera sedativo
Sedativo que vicia, acalma e anula
Sedativo que veda
Sedativo que entrega e estraga o gozo.
Seda e retém o desejo
E suga, suga, suga, suga
Suga.

 

Suga mais aqui pra voltar pro NÃO.