NA NOITE

 

por Paulo Wainberg

 

 

São três horas da madrugada. Você está sentado. A mesa é pequena e quadrada, sobre ela uma toalha de plástico quadriculada, azul desbotado de velho e branco manchado de sujo. A garrafa de cerveja está vazia e de seu copo, pela metade, você bebe um gole, sentindo o gosto amargo da bebida quente descer da sua boca pela garganta.

A peça é grande. Nas paredes apliques sujos e cheios de insetos, com luzes vermelhas, azuis e cor de laranja. No teto, três ventiladores giram lentamente. A maioria das mesas está desocupada mas, numa delas, um grupo de executivos fala alto, dispara gargalhadas bêbadas e você até escuta algumas declarações apaixonadas para as prostituas de pernas cruzadas e fumando, com sorrisos maliciosos.

A orquestra, mais do que desanimada, composta de piano, saxofone, bateria, dois violinos tocados por dois velhos, um clarinete empunhado por um jovem drogado e um cantor negro, homossexual, com um casaco com brilhos de prata e ouro, cabelos escorridos e brilhantes, interpreta Feelings.

Na pista alguns casais dançam, muito agarrados. Entre eles está a prostituta por quem você é apaixonado. Mas para tê-la você tem que pagar. E você está sem dinheiro.

Você se contorce ao ver como ela encosta o corpo no corpo do parceiro, como ela passa a mão no pescoço dele, no cabelo dele, como ela dobra o joelho e ergue o pé direito, num sapato fechado de salto alto, num passo de dança que ao mesmo tempo aumenta a pressão da coxa dela na dele.

Você se desespera e toma o que resta da cerveja. Você agora só tem dinheiro para o ônibus ou para outra cerveja. Seu coração está dilacerado pela paixão e pelo ciúme. Você quer sair mas tem medo de sair. Quer ficar e tem medo de ficar. Ela vira a cabeça e olha para você. Sabe o que você está sentindo e provoca. Provoca. Provoca. A música termina mas eles não se separam. O homem beija a boca de sua amada. Você sabe que ele está enfiando a língua dele dentro dela, da boca, tocando a língua, os olhos fechados dos dois são punhais em seu peito. As mãos deles percorrem as costas nuas dela, entram no decote do vestido, acariciam a bunda, as coxas, ela se remexe, se encosta, rebola.

Você suspira, tira o dinheiro do bolso e pede outra cerveja, a última que pode pagar.

O cantor negro homossexual está cantando agora: Você sabe o que é ter um amor meu senhor....