Política é coisa para (poucos) adultos
Por Paulo Gonçalves
Um amigo me procurou pedindo opinião sobre questão pessoal. A ex-esposa, publicitária, pretende utilizar a imagem da sua filha, de nove anos, numa propaganda de político, num desses guias eleitorais que enchem a paciência dos telespetadores e dos donos de emissoras. O amigo insistiu querendo saber o que acho. No começo relutei, lembrado do velho conselho sobre não se envolver em conversas alheias - principalmente conjugais, ou, muito pior, ex-conjugais. Todavia, pela abrangência e atualidade do assunto, resolvi meter a minha colher.
No imaginário brasileiro é recorrente cenas de políticos abraçando crianças, erguendo-as nos palanques, beijando-as, brincando com elas e posando de inocentes e puros anjinhos. Velhas raposas de todas as colorações desse amplo arco-íris ideológico, fazem ou fizeram isso. De Brizola a Maluf, de Collor a Prestes, de Lula a Figueiredo (até ele, que gostava mais do cheiro de cavalo), sempre aparece um para tentar nos vender a imagem de amigo dos pequeninos, tal e qual Jesus, numa demagogia sem par. Isso não é novo, nem vai acabar tão cedo, enquando os pais e responsáveis não tomarem a defesa de suas crianças, salvando-as ao menos dessa prostituição ideológica (já que está difícil livrá-las das danças, roupas, músicas e imagens eróticas, sem falar na violência).
A política é, por definição, uma ciência situada muito além da capacidade de compreensão e apreensão do público infantil. Usar a imagem de uma criança em programa que vende ideologia política e persegue o poder em detrimento de outra parcela da sociedade, seja ela qual for, é um absurdo comparável ao que faziam os velhos papa-figos das nossas remotas assombrações: ofereciam bombons para aproveitar-se de nossa inocência e cometer pecados inonimáveis.
E o que querem os políticos e seus marqueteiros ao utilizar crianças como chamariz para o voto, senão aproveitar-se da sua credulidade para conquistar o poder e, chegando lá, fazer só Deus e as paredes sabem o quê? Alguém pode até argumentar que os fins justificam os meios. Mas também para esse caberia a pergunta: e se ao crescer a criança compreender que foi ludibriada e utilizada em nome de uma proposta política que não combina com os seus ideais de vida, quem pagará esse prejuízo? Ou será que ao usar a imagem das crianças e dos adolescentes, os políticos e marqueteiros querem, por tabela, fazer-lhes a cabeça, num processo gramsciano ou pavloviano de lavagem cerebral, sutil e coletiva?
Deixo essa questão para reflexão dos interessados.