LUISA E ANTÔNIO

Alexandre Nix

rio20749@terra.com.br

Luisa ia confessando ali mesmo, no ponto de ônibus. Antônio ia ficando roxo, verde, branco e depois de um tempo vermelho, vermelho-fogo, vermelho-bombeiro...

Antônio se virou. Luisa sentiu que ele estava se contendo de raiva. Antônio sempre ficava de costas quando estava com raiva. Não gostava de olhar para ela quando nervoso. Luisa sabia disso e pensou consigo mesma:

- Depois de dez anos de convívio, a gente aprende todas essas "coisinhas" do marido.

Conhecer as "coisinhas" para ela significava tudo: comida preferida, onde ele escondia as economias, os amigos de farra, os amigos de trabalho, o jeito que ele ficava quando realmente estava com raiva...

O silêncio entre os dois parecia contaminar a rua. Luisa não ouvia mais os carros, as conversas alheias, o som das portas se fecharem... o silêncio era uma faca penetrando no seu pescoço. Ela tinha de dizer algo, mesmo sabendo que nessa hora, nada poderia ser dito para melhorar a situação.

- O que você vai fazer quanto a isso?

Ao proferir tal pergunta, Luisa se arrependeu. As palavras saíram em um tom tão frio, tão cínico... pensou em emendar algo mas desistiu ao ver Antônio levanta o braço.

Um soco, pensou. Um tapa ou um soco. Depois de dez anos de casamento era isso que ela merecia mesmo. Fechou os olhos e no segundo que lhe restara antes de levar o golpe, pensou em desistir dessa loucura. Antônio era o homem que ela queria! Responsável, trabalhador... um pouco bronco, porém íntegro, saudável e pacífico. Antônio nunca levantara a mão pra ninguém! Talvez dessa vez, o fato fosse terrível até para ele suportar. Talvez fosse agora a hora do primeiro golpe.

O golpe não veio. Abriu os olhos e não achou Antônio. Estava sozinha no ponto. Olhou para trás e entendeu. Antônio nunca levantaria a mão para alguém a não ser, é claro, para o motorista do ônibus.