O SOFISTA BOQUIRROTO
Marco Antonio Trisch Mendonça
Estamos num estágio civilizatório em que a informação é rápida, abundante, instantânea, quase caótica. Nesse caudal informativo globalizado, o que chama a atenção é que a razão deixou de ser um referencial para se tornar um adereço, quase dispensável. Quando a questão vai para o campo das idéias e concepções então, o vale tudo está instalado.
Prova disto é o fantástico espaço dado pela mídia aos novos sofistas de plantão. Sofista é aquele que usa erros de pensamento em que, de má-fé, se empregam argumentos falsos com aparência de verdadeiros. Por conseqüência, nas colunas de opinião dos jornais, rádio e TV eles abundam a olhos vistos.
O autoproclamado filósofo Olavo de Carvalho faria Platão rolar na tumba, tal a ojeriza que ele tinha dos sofistas de sua época: eram grandes estudiosos, com grande capacidade de defender ou refutar uma tese apenas por domínio da arte retórica, mas a busca da verdade, ah, isso era detalhe.
Esse fanfarrão acha que atingiu o nirvana do conhecimento humano, detendo o monopólio da razão, chegando onde nenhum outro pensador esteve antes apenas porque ficou vinte anos estudando filosofia fora da academia e agora surfa atrasado na onda do anticomunismo histérico.
Eu, que dei uma "lambida" na Arte Retórica de Aristóteles e outros, fico estarrecido como truques infantis de retórica são usados, abusados e expostos como troféus da razão. O ataque sistemático aos oponentes e suas idéias apenas com sarcasmo e zombarias não são argumentos sérios, ainda mais quando irreais. Se você tirar os adjetivos dos argumentos dele, sobra apenas o pó. Para provar o que digo, vou citar aqui o que ele publicou n'O Globo no dia 2 de dezembro, sob o nome de "O futuro da boçalidade":
"...Para desgraçar de vez este país, a esquerda triunfante não precisa nem instaurar aqui um regime cubano. Basta-lhe fazer o que já fez: reduzir milhões de jovens brasileiros a uma apatetada boçalidade, a um analfabetismo funcional no qual as palavras que lêem repercutem em seus cérebros como estimulações pavlovianas, despertando reações emocionais à sua simples audição, de modo direto e sem passar pela referência à realidade externa.
Há quatro décadas a tropa de choque acantonada nas escolas programa esses meninos para ler e raciocinar como cães que salivam ou rosnam ante meros signos, pela repercussão imediata dos sons na memória afetiva, sem a menor capacidade ou interesse de saber se correspondem a alguma coisa no mundo.
Um deles ouve, por exemplo, a palavra "virtude". Pouco importa o contexto. Instantaneamente produz-se em sua rede neuronal a cadeia associativa: virtude-moral-catolicismo-conservadorismo-repressão-ditadura-racismo-genocídio. E o bicho já sai gritando: É a direita! Mata! Esfola! "Al paredón!"
De maneira oposta e complementar, se ouve a palavra "social", começa a salivar de gozo, arrastado pelo atrativo mágico das imagens: social-socialismo-justiça-igualdade-liberdade-sexo-e-cocaína-de-graça-oba!..."
Diante de asneira tão grande, não sei o que dizer. Só posso pensar que é fruto da idiotice ou do ácido que esse cara deve tomar. Quer dizer que a esquerda já está no poder, controla todo o sistema de ensino do País e as mentes dos jovens? Quer dizer que os jovens são cães que associam social com socialismo-justiça-igualdade- liberdade-sexo-e-cocaína-de-graça-oba!? O que é isso?
Eu, que sou comunista, queria que os delírios anticomunistas do Olavinho fossem 10% reais, talvez os trabalhadores não estariam na merda que estão. O que esses "pensadores" não têm coragem de dizer é que eles querem tirar do ser humano a capacidade de interpretar sua realidade e transformá-la, querem reduzir a classe trabalhadora à uma condição bovina de existência. Afinal, para quem não ganha 151 pilas por mês e recebe um régio soldo das entidades patronais para rosnar, a situação não é tão grave assim.