Os melhores do mundo Gustavo França
Toda vez que a seleção brasileira derrapa nas Eliminatórias da Copa, volta-se a ouvir as famosas previsões: o que ocorreria se, pela primeira vez, nosso escrete ficasse de fora da mais famosa competição contemporânea? Para muitos, seria "o caos absoluto, uma tragédia vesuviana que feriria letalmente a auto-estima do brasileiro". Outros vêem tal possibilidade como um "princípio de redenção". Bobagem!
Países com a população tão ou mais fanática (a julgar pela lotação de estádios) já deixaram de se classificar, e nem por isso alguma coisa mudou. A Argentina continuou com o messianismo de sempre (de Evita a Maradona). Os uruguaios se acostumaram a sonhar em preto e branco. A Itália cultua tantas tragédias (coliseu em ruínas, cidades destruídas, torre inclinada...) que mais uma não fez diferença. Os ingleses agüentam qualquer coisa, vide a família real. No nosso caso, no máximo teríamos 3 meses infestados por debates de botequim para apontar os culpados, execrar uns dois ou três bodes expiatórios e continuar na mesma. A vida, como eventuais bolas murchas, iria rolando e enrolando até o furo fatal. E aí não há remendo que dê jeito.
Por outro lado, há anos tem sido cultivado um novo mito nacional, que, se um dia desmascarado for, sabe-se lá o que pode provocar. Faz algum tempo que estatísticas mundiais não deixam dúvidas: somos os campeões universais do sexo!! Pesquisadores de todas as partes do globo se impressionam com depoimentos de nossos habitantes sobre suas performances eróticas. Todos os recordes (com exceção da duração do ato, auto-atribuído ao músico inglês Sting) pertencem à população canarinho. Como Arnaldo Jabor já relatou após a Olimpíada de Barcelona, a filosofia que rege torcida e atletas é "podemos perder todas, mas ninguém come mais mulher que a gente!".
Para manter-se por cima, ou embaixo (vai da preferência de cada um), o Brasil prepara os futuros campeões desde pequenos. Mal aprendem as primeiras palavras básicas (tchutchuca, popozão...), já começam a descobrir utilidades além das funções fisiológicas para os órgãos genitais. Para monitorá-los nesta fase, apresentadoras infantis são clinicamente selecionadas. A música também é importante, especialmente no desenvolvimento da ala feminina. Brincadeiras descartáveis, como esconde-esconde e amarelinha, deram lugar ao apogeu da ginecologia precoce.
Como se vê, graças a um primor de organização, o país tem todos os requisitos para ampliar sua decantada vantagem sobre os rivais. Até chegar o dia em que esse talento, ora transformado em atração para turistas, passará a ser questionado pelas autoridades internacionais. Constantes exageros nas respostas de pesquisas levarão os analistas a um contundente "Pera lá!!!", e a autenticidade dos resultados será posta em xeque.
Ante a insinuação supostamente absurda, a Sociedade brasileira se mobilizará em nome das tradições ofendidas, exigindo as devidas desculpas dos detratores. Na ONU, os estadistas reunidos (igualmente desconfiados do folclórico desempenho) concluirão só haver uma maneira justa de decidir o incidente diplomático: colocar à prova não apenas o potencial tupiniquim, como o de todo o mundo, para saber, de uma vez por todas, quem são os melhores.
Isso mesmo, meus caros! Uma Sex Cup, com regras preestabelecidas, transmissão via TV, rádio e internet, mais patrocínios milionários (medicamentos de incentivo, preservativos, afrodisíacos, etc...), no mais elevado profissionalismo. Todos os países serão convidados, devendo enviar uma equipe com 20 atletas de ambos os sexos, para modalidades estritamente heterossexuais - apesar de larga adesão, o lobby das entidades gays se verá frustrado pelos mais conservadores.
Os jogos serão realizados de quatro em quatro anos, com os primeiros no Rio de Janeiro, que enfim poderá realizar o sonho olímpico - em pleno Carnaval. Para não fazer feio, a recém-criada CBS torrará fortunas na preparação. Em dois meses de intensas seletivas entre atletas de todas as regiões, finalmente se chegará ao time dos sonhos molhados. Aproveitando os olhos, mentes e membros da Nação voltados à contagem regressiva, o poderio da Rede Globo novamente fará a diferença na guerra pela audiência, com a compra da exclusividade. As outras emissoras, para não serem engolidas, dedicarão sua programação a comentários especializados sobre o evento e ao acompanhamento das insólitas Olimpíadas Eróticas de Birigui - para maiores detalhes, perguntem a um certo Sanchez, advogado loroteiro que jura não só a existência do certame, como ser seu maior vencedor.
Na estréia, passaremos fácil pela Etiópia. "O primeiro passo para o reconhecimento definitivo da força desse povo sofrido, mas que é feliz!" - festejarão os velhos ufanistas. Contra o Japão, um surpreendente empate, mesmo com todas as gozações dos espectadores para desconcentrar os nipônicos. A justificativa do treinador e massagista: "É, não existe mais ninguém bobo nesse assunto!". Mas a classificação na primeira fase estará garantida numa vitória sobre a fraca seleção de Luxemburgo (não é preciso dizer que o sorteio de chaves gerará uma certa polêmica.). O Brasil sairá em primeiro lugar, para enfrentar justamente os rivais portenhos, vindos da repescagem de um grupo com Estados Unidos, França e África do Sul.
A segunda fase se iniciará com uma semana de intervalo, para propiciar uma melhor recuperação do fôlego gasto em tórridas disputas. Tempo suficiente para gerar o já esperado clima de guerra entre brasileiros e argentinos. "Funk contra Tango!" - dirão as manchetes. Nas ruas e bares, cada um com sua própria opinião sobre a melhor estratégia. "Não podemos cair na provocação deles, que é o que eles querem!" Mas o clima será otimista: "Temos mais técnica e malícia, sem contar a ginga de corpo!" Tudo pronto para a festa assim que o último adversário tombasse na cama.
No dia seguinte, adivinhem o assunto da primeira página dos mais renomados jornais do país: BROXAMOS NAS OITAVAS!!!! "Após batalha ferrenha, nosso atleta mais bem cotado (com "c", bem entendido) sentiu a pressão e deixou a partida mais cedo. Era do que os argentinos precisavam para ganhar moral e superar as provocações da torcida."
O Brasil dará a casa, a comida, os motéis, e acabará virando mero voyeur dos visitantes. Aí sim, a desolação será completa. Periódicos internacionais não hesitarão em explicar o fracasso com chavões maldosos ("Quem fala muito..."). E o que virá depois? Difícil imaginar. Qualquer psicólogo de colégio sabe que uma brusca desilusão, ainda mais sobre elemento de tal importância na formação do caráter nacional, pode criar um trauma incalculável. Talvez o efeito seja o mesmo do pós-guerra na Alemanha, ou do fim do comunismo na Rússia. Pode ser que a oposição culpe o governo, o Mc'Donald's e a falta de amor à camisinha, com direito a uma CPI para saber "as verdadeiras causas da derrota". Mas certamente serão tempos confusos, misturas de inconformismo, apatia e reprises da Noviça Rebelde.
E a Sex Cup deve mesmo se resumir à primeira edição, já que seu real objetivo (acabar com a panca verde-amarela) terá sido conquistado prematuramente. Ou "precocemente", já que estamos falando de futebol.
Acredite: lubi-lubi é melhor que futebol.