Vida de Professor
ou Todas as desculpas furadas que um dia apliquei hoje ouço

Roberto Tietzmann


 

Vamos deixar uma coisa bem clara, para todos os leitores. Dar aula é massa. E as desculpas furadas, bom, elas são mais velhas que andar para a frente. Portanto alertem-se!

Sejam eles alunos de alguma instituição, ex-alunos ou ainda que pensem em ser alunos: vocês NÃO inventaram as desculpas furadas e a cara-de-pau.

Aliás, nem a minha geração inventou. Especula-se que desde os gregos recicla-se as desculpas esfarrapadas. Ou ainda antes, desde que o primeiro macaco inventou a primeira aula.

Resumindo, tão velho quanto andar para a frente é dizer que O TRABALHO FICOU COM O COLEGA QUE NÃO VEIO e concluir que a melhor coisa é ir embora, já que o colega não vem mesmo. O que nos leva a um paradigma da enrolação: o colega que não veio na aula é sempre o que mais trabalhou!!

E o segundo passo na cadeia progressiva de engambelação é, na aula seguinte, chegar o colega que deveria estar com o trabalho. Só que daí ninguém mais do grupo veio. O que o leva à pergunta ao professor:

– Cadê meu grupo?

Ao que o professor responde:

–Sei lá. Cadê o trabalho?
–Que trabalho?
–Aquele que vocês deveriam ter entregue há uma semana.

O aluno gira os olhos. Engole em seco. Um sorriso ilumina seu rosto.

–Entreguei para o grupo, professor!
–E cadê o grupo? Cadê o trabalho?
–Não sei. Vou procurar.

O aluno sai da sala. Dez minutos depois, vem mais um aluno, do mesmo grupo.

–Oi, profe. Viu alguém do meu grupo?
–Veio um, mas saiu. E o trabalho?
–Ah, está com a Lisi. Ela ficou de passar a limpo, mas a impressora dela pifou, e ia imprimir aqui na universidade.
–E já imprimiu?
–Não sei, vou ver.

E sai da sala. O grupo só aparece três semanas depois, mais atrasado que noiva em casamento. O trabalho dá vontade de chorar de tão ruim.

–E isso aqui?
–Ah, professor. A gente ia fazer uma coisa superlegal. Mas daí, um não queria, o outro não queriaŠ daí a gente acabou fazendo assim. Todo mundo trabalha, pçor! Mas o senhor considera a nossa idéia, não é?

Isso vem a ser, traduzindo em bom português: "Resolvemos fazer um trabalhinho preguiçoso, e queremos uma nota boa. O sr. vai dar, né?".
Sim, podes crer. Considero que já é meio esquisito me chamar de senhor. E considero o trabalho merecedor de uma nota mais baixa. Rê rê rê!!

Isso para contar os causos de arrepiar os cabelos. Ignorando as desculpas de genocídio familiar ao final do semestre (as avós que morrem três vezes, em cadeiras diferentes), os grupos que fazem trabalhos massa e entregam no prazo (preservando as férias e o bom humor do prof.).

A maior que já me aconteceu foi no início de um semestre. Primeiro dia de aula, aquela tradicional aula de se apresentar, apresentar a cadeira, etc. Como isso não segura Ibope, pisei fundo e comecei com o conteúdo. O pessoal respondia bem, fazendo perguntas e tal. De repente chegou uma guria atrasada.

– Desculpe, pçor!

E sentou-se no fundo da sala. Em um canto.

O tempo passou. Todos peguntavam menos ela. Parecia acuada. Olhava tudo com olhos arregalados. A aula ia a todo vapor. Resolvi tirar aquilo a limpo. E perguntei direto para a guria de olhos arregalados:

– Alguma pergunta? Algum "como assim"? Não entendeu nada até agora? Fala, tchê!

Os instantes de silêncio pareceram durar para sempre. Todos olharam para a garota e se podia ouvir ela engolir em seco. Com uma voz trêmula, ela perguntou:

– A-aqui é fundamentos de RP?

Olhei para o número da sala. No início do semestre nunca se sabe. Coisa pior já aconteceu.

– Não. Televisão para publicidade.

A garota (que nunca disse seu nome) ficou vermelha feito um tomate, pegou seus livros e saiu da sala correndo. Nunca mais foi vista no campus. Pelo menos não daquela universidade. Será que ela errou algo mais que a sala?

Para mau entendedor, meia-palavra é bosta

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