Lula, para um olhar interessado

Patrícia Francisco

cinemapradois@hotmail.com


Quero falar de espera e esperança. Através de quatro eleições para presidente, construi argumentos sócio-políticos que revigoraram durante a campanha. O que faço, agora, é apenas socializar a minha expectativa e especular a origem da tristeza política que  persiste.

Meu primeiro voto, o segundo, também o terceiro e quarto voto para presidente do Brasil foram todos creditados a Lula. Um projeto de reformas está presente: reforma da previdência social, reforma tributária, reforma da legislação trabalhista e da estrutura sindical, reforma agrária e reforma política. Então, por que ainda estou triste ? Porque Lula é presidente e tem apoio no Brasil e no exterior. Porque sem "paixão", com razão, sem demagogia, com negociação, minha consciência canta : "Lula lá com toda certeza".

Sem privatização.Estou triste pelo provável retrocesso no Estado, pela falta de credibilidade das propostas do candidato vencedor no RS e porque poucas pessoas assistem ou escutam o horário político e os debates na tevê. O
distanciamento que gera ufanismo e "rigottagem"¹, além de outros desvios, levaram esses eleitores às urnas com pouco esclarecimento. Estou triste com a derrota de Tarso Genro, embora ele tenha dito domingo no Largo da Epatur
que tivemos uma vitória política. Talvez, essa tristeza possa ser emoção contida de 4 votos, 3 tentativas e 1 acerto. Então, penso que estou emocionada pela vitória nacional e não triste por uma derrota regional.

Uma saudação histórica aponta: vejo fotografias de Lula publicadas em jornais e revistas, ainda em outdoor e santinhos nas calçadas das ruas com legendas : Lula Presidente.

Estou silenciosa e sei de outros amigos que também estão, mas descubro, pouco a pouco, um ressurgimento de ideologia e projetos, antes utópicos, nessa emoção contida que vai acordando depois da espera. Eu sou filha da
ditadura. Eu tive a educação prejudicada pela censura insana que marcou e deixou seqüelas na vida dos estudantes da minha geração. Criança, eu cantava na escola, aos 5 anos, "eu te amo meu Brasil/ eu te amo/ ninguém segura a
juventude do Brasil", sem saber as intenções da canção, criava apenas um sentimento nacionalista.Dessa forma, contrui e cresci para uma social-democracia, mais humanista, e não da forma que a escola apresentava, um canto alienado sob a demanda de um regime totalitário.

Fico emocionada sim. Estou muito emocionada ainda. Domingo, estava na Cidade Baixa, bairro de Porto Alegre onde concentra o maior número de petistas, e olhava, com minha bandeira, admirada para as pessoas que gritavam e cantavam os jingles da campanha, como eu fazia há um dia atrás.

Se escolho candidatos com projetos mais voltados para programas sociais do que para programas econômicos é porque acredito em outro ideal de país que ainda não vigora, mas inicia: "se, ao final do meu mandato, cada brasileiro
puder se alimentar três vezes ao dia, terei realizado a missão de minha vida"². Assim,Lula cria a Secretaria de Emergência Social.

Lula representa o conjunto do povo, a mudança e a firmeza de que esse governo tem "plena consciência de que a grandeza dessa tarefa supera os limites de um partido."³ E, ontem, ao final do pronunciamento, afirmava "meu
coração bate forte. Sei que estou sintonizado com a esperança de milhões e milhões de outros corações. Estou otimista. Sinto que um novo Brasil está nascendo."

Lula é presidente. Eu tenho 28 anos e esperança!

Porto Alegre, 29 de outubro de 2002

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¹ "rigottagem" é uma palavra inventada, oriunda do sobrenome do governador eleito Germano Rigotto

² pronunciamento do presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva em 28 de outubro de 2002

³ idem ao 2