Menos realista que o rei Daniel Peccini
É preocupante o pessimismo, a realidade nua e crua sem banho-maria nem nada. Acho que o pessimismo é parente muito próximo do medo e ultrapassar a imensa barreira dos pessimistas é um desafio importante nas nossas vidas.
Você já tentou trocar de emprego? Pois uma legião de criaturas estranhas irão dissertar sobre todos os anos que você perdeu naquele lugar e que jogar tudo fora seria uma loucura. Seu ex-chefe vai falar mal de você. A fila dos desempregados começa as 3 da madrugada e não tem hora para terminar.
Você já tentou acabar um relacionamento? As mesmas criaturas estranhas irão dizer que você vai ficar sozinho e deprimido. Você vai se arrepender e quando tentar reatar ela já vai ter encontrado outra pessoa. Você vai ficar velho e fazer companhia as enfermeiras num asilo de quinta categoria. Mas nem tudo será tão ruim, talvez elas sejam gostosas.
Como diria um antigo comentarista esportivo: "não sejamos mais realistas que o rei". Sonho não é só aquele bolo recheado com goiabada ou doce de leite. No fundo todas as pessoas sonham, a diferença é que algumas pessoas tentam realizá-los outras preferem o tradicional pão com mortadela.
Todos os dias quando acordo, ao mesmo tempo que exerço as atividades normais de um recém-acordado, processo em paralelo pensamentos desconexos com a realidade a ser vivida daqui alguns minutos. São momentos em que permaneço dormindo acordado. Interromper este processo acaba com o meu dia. É como se faltasse luz, tudo se apaga. O caminho até o trabalho é longo. Ônibus e trem. Perfeito. Muitos minutos para construir longos raciocínios e observações durante o caminho. Pode ser um carro antigo que passa, um mendigo pedindo esmola ou a moça do banco ao lado. Jogue tudo num balde, misture bem e pinte uma parede. Está lá alguma aspiração, decepção, visão ou o mendigo. Sonhos.
Os pessimistas pensam macro e os otimistas pensam micro. Exemplo: o vinho. Um pessimista pensa: é uma garrafa de vinho. Um otimista reflete: os sabores, a cor, os odores, o copo, os teores, a garrafa, etc... Para alguns a cor pode ser macro. Então irão extrair os reflexos, o brilho, a tonalidade. E assim por diante.
Mesmo sendo parcial e muito otimista, acredito que os pessimistas são importantes para algumas coisas. Os bons médicos devem ser os pessimistas mais radicais, os médicos-talibãs. Já pensaram ter que aguentar um médico dissertando sobre a coloração da bílis?
- A bílis lembra os arvoredos em dias ensolarados de inverno. Os pontinhos pretos são pequenos esquilos serelepes catando castanhas que despencam do cume de tão belas pinturas da natureza.
Enquanto isto, o paciente lá na maca gemendo de dor. Ah, não.
Mas um ótimo açougueiro deve ser um otimista. Os pedaços de carne são muito parecidos e imaginar em que região do corpo da vaca ele teve origem deve ser estimulante. É algo como montar um quebra-cabeça em três dimensões e mergulhar dentro do bicho. Entramos pela boca, já percebe-se a língua, acima os miolos, mais a frente as costelas, abaixo a picanha, logo alí a esquerda o filé mignon, abaixo a maminha, estamos quase no fim, testículos e saímos pelo... ahmm, rabo. Se eu fosse professor de biologia convidava um açougueiro para fazer uma palestra.
Pessimistas viram otimistas.
Pessimistas jogam na loto toda semana.
Pessimistas contam seu dinheiro todos dias.
Pessimistas casam-se uma vez na vida.
Pessimistas nunca entram no crédito especial.
Pessimistas não possuem vícios.
Otimistas não viram pessimistas.