[ NÃO 80 ]
outubro/2004


YAMANDU E A ESTÉTICA DA CHURRASCARIA
*alvaro magalhães

O Yamandu Costa é um grande talento musical. Como já disse Herbie Hancock sobre a inveja que sentia da habilidade do pianista cubano Gonzalo Rubalcaba, "dá vontade de quebrar os dedos dele". Além de ser um grande guitarrero - que difere do violonista ou do guitarrista nem tanto pelo repertório mas pelo jeito de tocar - o cara dominou o repertório do violão brasileiro com maestria. Até aí, choveu no molhado.

Durante a apresentação do trio de Yamandu no Clube do Choro de Brasília, saquei que o estranho na arte do cara não está no simples excesso de notas ou demonstrações inúteis de habilidade manual. O turbilhão de sons e a força que emprega "faz parte do show" de quem cresceu em bares e churrascarias gaúchas, o que exige dos artistas um espetáculo capaz de superar as animadas conversas e barulhos vários muitas vezes reverberados em lajotas. O melhor exemplo talvez seja a dança com boleadeiras.

Há algum tempo defendo a tese de que a principal expressão da culinária brasileira é o churrasco, seja nas festas privadas (familiares ou corporativas) seja na expansão das churrascarias (especialmente a de espeto corrido ou rodízio como dizem por aqui). Dou-me conta que a churrascaria e os bares de comida campeira produzem uma estética além da culinária, e, que o Yamandu - talvez o mais brilhante músico jovem brasileiro - é fruto de uma estética. Como é gênio, ele consegue façanhas tais como tocar choro como um carioca. Mas o terreno dele é na confusão, na barulheira, com cheiro de carne e carvão.

Álvaro Magalhães

 

*sociólogo, músico, gestor público do Ministério da Cultura e sócio-fundador do Não

 

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