[ NÃO 80 ]
outubro/2004


SUPER8 E DEPOIS
*luiz_roque_filho
Na virada dos anos 90, Porto Alegre, era o grande centro produtor de cinema super8 do Brasil. Dezenas de filmes montados e sonorizados em película eram projetados no Festival de Gramado. “Super8 gaúcho” virou uma espécie de subcategoria, quase um gênero dentro da cinematografia curta brasileira. A suposta autonomia desse centro foi tão grande que o Festival de Gramado vetou durante três anos a participação de trabalhos não-gaúchos.

Existia alguma semelhanças entre esses filmes ? De fato muitos deles eram similares, tentando reproduzir uma atmosfera cinematográfica muitas vezes incompatível com a bitola. Talvez essa postura se espelhasse nos bens sucedidos filmes (principalmente os longas) feitos por Giba&Gerbase nos anos 80 ou simplesmente talvez pela referência de cinema de curta-metragem disponível na cidade. Foi um “movimento” estritamente ligado ao local, espécie de bairrismo tão popular no Rio Grande do Sul.

Passada a euforia da produção do Super8 gaúcho, do qual animadamente fiz parte, penso que a defesa e a manutenção da feitura desse precário cinema está fundamentalmente ligada a uma idéia de tradição e independência que está na natureza de nossa sociedade.

A idéia do NOSSO exerce um fascínio sobre os gaúchos e a possibilidade do EXCLUSIVAMENTE NOSSO é praticamente a glória. Era unanime que não se poderia fazer cinema com vídeo e que o super8 representava uma alternativa ao cinema no fim dos anos 90. Quase todos os realizadores tinham sua própria câmera super8 (algumas verdadeiras raridades e em perfeito funcionamento) enquanto as práticas e usualíssimas câmeras de vídeo eram privilégio de poucos.

O fortalecimento dessa prática se dá nessa atmosfera de bairrismo, para não dizer grossura. Acredito que essa falsa supremacia e exclusividade tenha travado um pouco o desenvolvimento da linguagem do vídeo por aqui. Afinal, além de considerado “arte povera”, o vídeo não era uma ícone da cultura underground gaúcha. Pouco ou nada se via de linguagem videográfica em Porto Alegre, salvo alguns eventos como o Cinemeando no Garagem, exibições de filmes&vídeos coordenada por dois cineastas gaúchos que acabou quando um deles começou a trabalhar com bitolas mais profissionais provocando um certo descontentamento no outro.

Essa postura gerou uma grande defasagem no cinema gaúcho que hoje vê que o vídeo também é cinema, talvez se dando conta que cinema é uma questão de espaço expositivo e não de linguagem ou técnica. Outras regiões como Minas Gerais, por exemplo, realizam desde meados dos anos 90 uma séria pesquisa videográfica. O curioso é que a imagem Super8 é muito explorada por vários desses realizadores que usam o suporte como apoio e não como condição. Por aqui, os poucos que conseguiram tirar proveito das especificidades/deficiências da bitola não levaram essas pesquisas adiante transformando esses filmes em peças meramente visuais e gratuítas.

Cineastas como Cao Guimarães, Lucas Bambozzi e Kiko Goifman são egressos dessa formação híbrida e considerados autores que estão de certa forma oxigenando o sistema de produção do longa-metragem brasileiro. Usando o vídeo como meio principal conseguem viabilizar interessantes projetos e fugir dos orçamentos milionários dos longas, que em termos de idéia e criatividade ainda devem muito ao vídeo. 

Isso é uma alternativa para o cinema gaúcho (ao menos para minha geração) que agora parece estar madura para filmes com duração superior a 15 minutos mas muito ligado ao esquema oficial de produção. Esse método de produção é necessário para muitos roteiros, mas as vezes fico pensando no filme uruguaio 25 WATTS, feito de maneira parecida aos primeiros longas gaúchos, aqueles em Super8. 
 

*artista multimídia

 

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