UM PROFESSOR
por João Knijnik
osanosjk@uol.com.br


- Só um momentinho , amigo, não quero tomar muito seu tempo.. Eu sou professor, moro em Brasília, cheguei aqui  para trabalhar, porque eu também sou desenhista, sabe.O arquiteto que me contratou viajou e só volta daqui há 4 dias. Eu gastei todo dinheiro no hotel e ai tive que ir para rua. Faz duas noites que eu to na rua, sem banho. Fiz a barba mas to sem banho.

- Não posso te ajudar, lamento.

- Pois é. O cara só chega quarta-feira. Eu tenho que esperar 4 dias assim. To desesperado. Eu queria que o senhor me levasse para comer um prato de comida. Eu cheguei num restaurante, falei lá que eu trabalhava lavando chão, louça, qualquer coisa por um prato de comida. Aí o homem disse que isso só acontece em filme e me mandou sair, me enxotou. Eu sou professor, pombas.

- O que eu posso te dizer que o teu enfoque ta errado. Ninguém sabe que você é professor aqui. Ninguém quer aprender o que você tem para ensinar. Cultura nunca paga conta nesse país. O Brasil é farto, tem comida para todo mundo. Olha só o que tem de restaurante nessa rua. Mas o país valoriza quem tem dinheiro.  Pode tudo, menos ter dinheiro. Mas como é que você entrou nessa roubada?

- Sei lá. Deu azar, eu to a dois dias na rua. Tenho que esperar ainda 4 dias. Me diz, meu amigo, o que eu faço numa hora dessas?

- Não sei, cara. Volta para tua terra.

- Com que dinheiro?

- Este é o ponto. Você precisa de dinheiro. Aumenta tua renda. Compra bala, chiclete, chocolate e vai vender nos ônibus. Uma bala custa setenta centavos, vende por um real. Final do dia você vai ver que vai levantar algum. Tem que ser produtivo.

- Mas eu preciso comer alguma coisa agora.

- Ta aqui cinco reais. Não tenho muito. Nem sei se a tua história é verdadeira. Conheço ator ai que faz direitinho teu papel. Tem muito vigarista que descola grana assim como você. É só isso que eu disponho para te ajudar.

- Eu não vou agüentar mais uma noite na rua.

- Tem que agüentar. Se não você vai morrer. Tem que acreditar que você vai sair dessa. É a única chance.

- Eu preciso agora de sete e noventa. Aí eu como o que eu quiser  no buffet aqui do lado.

- Come pastel, ovo duro, ta cheio de boteco ai. É mais barato. Vai , cara, força e sorte. Você vai precisar. Procura um albergue. A policia vai te informar ai como chegar em um.

- Eu  sou professor. Não sou mendigo.

- Agora não é hora de definições. Não devia nem ter feito a barba. Tenta salvar tua vida, com ela depois você resgata a dignidade e lembra disso como um pesadelo. É preciso estar vivo. Sorte, cara. Não tenho muito para te ajudar.

- Ta bom. Obrigado.  Eu precisava desabafar com alguém.

- Ta bem. Agora vai.

- Desculpe incomodar.

- Tchau