Apresentamos aos leitores um novo gênero de literatura.
Não é poesia, mas também não é prosa.
Não é romance, nem novela, nem conto, nem crônica,
nem comédia, nem drama, nem biografia. Ao mesmo tempo, é
também um novo estilo literário. Não é romântico,
nem realista, nem clássico, nem barroco, nem modernista, nem surrealista,
nem simbolista, nem impressionista. E também fala sobre um novo
tema: nem amor, nem vida, nem morte, nem procura, nem descobrimento, nem
religião, nem pornografia. Talvez a melhor definição
para essa coisa seria "um esquizofrênico e incompleto modelo literário
escrito a três mãos". Tão esquizofrênico e incompleto
que o primeiro capítulo vai sair sem título.
CAPÍTULO I
A princípio, pode parecer que os fatos relatados neste "livro" possam por em perigo a segurança Nacional. Na verdade, como patriotas que somos, não teríamos coragem, ou melhor, não seríamos capazes de publicar qualquer coisa a este respeito caso não tivéssemos tido autorização expressa do governo deste país (Deus o tenha!). Assim é que nos sentimos com relativa disposição, e até obrigação, de mostrar aos leitores o que realmente aconteceu naquele ano fatídico que seria melhor nem lembrar.
Tudo começou no dia 1º de janeiro daquele ano, durante a festa de confraternização Universal realizada na casa do Ilustríssimo General Mangusto Bookmaker. Mal sabiam os trezentos e poucos convidados (e mais os cento e poucos não-convidados) tudo o que haveria de acontecer em conseqüência dos fatos daquela noite tenebrosa.
Entre os convidados mais ilustres figuravam: Necrófilo Mitsubishi, o maior estuprador de cadáveres de Tóquio, que, tendo ido tirar um curso de pós-graduação na Universidade do Alabama, pegou o trem errado e foi parar em Porto Alegre; Heinz Maracujá, homem de cenho carregado, modos delicados e aristocráticos, filho do Emir de Rhas-Al-Khaymma com sua 13ª esposa, uma bailarina espanhola aposentada; Zepelin Cordeiro, compositor pop de Viamão, famoso por seu recente caso com um guarda de trânsito francês que tentou multá-lo por dirigir seminu em alta velocidade na praia da Alegria; Mariazinha do Pole-pole, estrela do cinema nacional, conhecida mundialmente por seus papéis nos filmes "Conde Drácula vai ao dentista", "Os cabotinos também fazem amor" e "O planeta das piranhas"; e Comendador Aparício Matarrato, inventor do processo de industrilização da maconha em linhas de montagem, cleptomaníaco e com 360 graus de estrabismo, o que lhe dava uma visão quase normal.
O primeiro fato importante da festa ocorreu antes dela começar, quando o General Bookmaker conversava com sua esposa Margarida a respeito dos preparativos.
- Gugu, meu bem, você prefere a torta com nozes importadas ou com fios de ovos contrabandeados?
O General, com seus 150 quilos estirados numa confortável cadeira de balanço estilo colonial, cuspiu fora o charuto que tinha na boca e explodiu:
- Francamente, Margarida, então você não sabe que no 1º dia do ano eu gosto de comer é torta de tomates?
O segundo fato importante aconteceu enquanto chegavam os primeiros convidados. Quando o General Bookmaker foi receber o Sr. Samuel Manstein e sua esposa, que estava grávida, lembrou-se de algo tão terrível que o fez colocar as duas mãos na cabeça.
- My God! - exclamou - esqueci-me de Pindorama Muhamad.
Pindorama Muhamad, seu colega de infância, desde criança mostrara sua genialidade: inventou um sistema de puxar saco de professores praticamente infalível. Como é óbvio, ao crescer foi ser político. Era vereador no interior da Paraíba, mas conhecido em todo o Brasil por ter criado o anteprojeto de lei que pretendia diminuir para 15 dias o período de gestação. Na época, declarou à imprensa que o boicote emedebista ao seu projeto não passava de "mais uma manobra soviética para implantar o terrorismo no Brasil". E acrescentou: "Mas o povo não deve pensar que não estamos vigilantes. Providências hão de ser tomadas." E agora o General Mangusto Bookmaker havia se esquecido de convidar o seu mais dileto amigo para a maior festa que já havia dado em sua casa. Apavorado, pediu desculpas aos convivas e dirigiu-se ao telefone para tentar uma ligação com a Paraíba. No fundo, sentia-se satisfeito, pois pensava: "Até que enfim uma possibilidade de enredo para esta história".
Enquanto o General tentava telefonar, dois convidados (que não vamos identificar agora para deixá-lo curioso) confabulavam:
- Não soubeste dos boatos?
- Que boatos?
- Que esta festa é só fachada para uma reunião da A.A.R....
- Meu Deus, que horror!
Giba Assis Brasil escreveu este texto em 18/03/75 e ainda levou alguns
anos antes de desistir da literatura. Hoje finge fazer cinema, que é
bem mais fácil.