Os leitores não seriam leitores. Seriam almas flutuantes declamando o jornal às cinco da tarde na frente do monumento ao expedicionário. Conseguiuram relacionar-se bem com os desconhecidos, e viveriam amargurando a intimidade construída. Odiariam Woody Allen apesar de pensarem tudo o que Woody Allen pensa. Desejariam ser um pouco do que Janer Cristaldo é, nem que fosse somente por um dia. Assim deixariam de acreditar no amor e se libertariam. Se libertariam do quê? Não sei. Talvez do fascínio da imagem da decadência.
O ano. Nesse ano Ana Maria Taborda iria morrer. De câncer cerebral. O movimento estudantil ganharia corpo e passaria a viver, porque fisicamente passaria a sofrer. José Rubens Siqueira faria um outro "Amor e medo" e ganharia a Coruja de Ouro, mesmo que Jean-Claude não estivesse na comissão julgadora. Seria o ano da raposa e todos mentiriam dizendo estarem prontos para os novos dez mandamentos. Quem iria recebê-los de Deus no alto da montanha seria Oswald de Andrade. E Oswald trairia seu povo tomando o poder, cuja procedência era dos novos mandamentos. Sucederia outra praga de gafanhotos, outra praga de sapos e Glauber construiria uma enorme arca para salvar os primigênitos da condenação final. Glauber carregaria consigo seus filmes e à imagem deles tentaria criar um novo paraíso.
Mas sempre haveria um "A leste do Eden". E sempre haveria uma Jaqueline para transformar isso em um filme. Só que dessa vez seria impossível. James Dean está morto. Elia Kazan fez "Os Visitantes" sobre o Vietnam e "O Último magnata" sobre a sua ruína. Mas sempre haveria uma Jaqueline para maravilhar-se com "Vidas amargas" e uma Denise para chorar, séculos depois, com a farsamente trágica trajetória do homem que sentia o perfume das mulheres.
A esquina maldita se mudaria para uma next stop feita por um Larry Lapinsky que toma chopp e não capuccino. Nela, aos sábados e domingos, estaria José Onofre explicando o porquê do assassinato de Aldo Moro trinta anos atrás. Ele teria junto a si a Folha da Manhã e sua companheira maria Helena, filha do Cyro Martins e amiga de minha tia que hoje mora em Berkeley.
Raul Seixas seria o presidente do Brasil e poria o Euacho
como jornal oficial. Das 19 às 20 horas, no rádio, só
falariam aqueles que gostam de tomar banho de chuva. E na televisão
só trabalhariam supeeroitistas. Domingos de Oliveira se irritaria.
Maciel se aborreceria por não mais poder fazer "Ciranda cirandinha".
Magalhães Pinto escreveria para o Pasquim, de Londres. Roberto Carlos
ficaria como um novo Frank Sinatra, também na promessa de viajar
aos EUA. O dia começaria às dez da manhã e as máquinas
de escrever seriam jogadas fora pelas tigresas.