Ao abrir a porta com aquele sorriso de "sabia que você voltava" deparei com Inácio, meu amigão. E ele era amigo mesmo, daquele tipo que empresta mil dólares, faz chá e te cobre antes de dormir. Lindo, saudável, inteligente, mas sem um pingo de sensualidade. Dá pra dormir de mão com ele, que ele não te ataca. Me achava completamente maluca, mas para ele era legal se dar também com um tipo de gente que nem eu, que quebrava a rotina dos papos com as colegas do tribunal onde Inácio trabalhava.
"Mas e aí, Inácio, o que que tá rolando?"
"O trabalho continua o mesmo, sempre a mesma merda. Mas tô saíndo com a sobrinha da minha chefe, que é um tesouro."
"Bah, cara, temo te dizer que tu vai pra rua ."
"Eu sou concursado."
"Não acabou este papo de concursado?"
"E tu acredita que com este governo alguma coisa vá mudar de verdade."
"Mas tu votou neles!"
"Justamente pra não ir pra rua. O máximo que a velha pode fazer é botar o meu cargo à disposição. Mas isto ela não vai fazer porque eu sei umas estórias meio escabrosas dela que ele morre de medo que eu conte pra alguém."
"Tipo o quê?"
"O marido dela arranjou uma amante. A velha botou detetive e descobriu o hotel e o nome do marido da amante. Telefonou pro cara e deu horário e o local do répiauor do casal. Só que o que a velha não sabia é que o marido da vagabunda era traficante de cocaína e andava com capangas. Ele levou os capangas no hotel, na hora do encontro, e baixaram o cacete no marido dela. Ele ficou uma semana na UTI e a minha chefe rezando na igreja todo o dia tentando se redimir do pecado. O velho saiu do hospital mentindo que tinha sido assaltado. Isto tudo aqui em Porto Alegre. Só em Maceió acontece coisa pior."
"Mas me conta da namorada? Como é o nome?
" Aline. É linda, loira, tem uns peitos enormes, viaja o tempo todo, é a melhor que eu já tive!"
"E o que que esta Aline faz na vida?"
" Ela estuda Psicologia e faz estágio no departamento pessoal de uma empresa de um tio dela. Se desse eu casava com ela."
" E por que não casa?"
"Falta ela querer e o pai dela também. O velho dela é meio abonado."
"Tua família também é."
"Mais ou menos. A minha família veraneia em Torres e a dela tem casa em Punta"
"Ah, isto realmente faz diferença."
"Sei que tu tá me gozando,Clau."
"Quer beber alguma coisa?"
"Eu só tomo cerveja e tu sempre só tem vinho."
"Não, eu tenho umas cervejas que o Marcelo deixou aí."
"Hum, quem é este Marcelo?"
"Um carinha que eu ando saindo quando ele não tá numa churrascaria com uma picanha na boca."
"Bem feito, namorando um cara que gosta de picanha. Tu sempre falou mal de mim por ser carnívoro."
"Pois é, nunca se sabe o que vem pela frente.Solidão não é comigo."
A conversa fluia às mil maravilhas. Nem com minhas amigas mais íntimas eu me divertia tanto quanto com o Inácio. Sabendo que nunca ia transar com ele mesmo, tudo eu podia dizer. Mas naquele dia, como já havia perdido uma companhia pela boca, devia ter sido mais alerta e novamente botei tudo a perder. Começando minha segunda garrafa de vinho, Inácio disse:
"O, Clau, mas numa coisa tu tem que me ajudar. ( Lá vem). Eu e a Aline temos o maior tesão um pelo outro (Só imagino), mas quando chega a hora de eu me acabar pinta o maior clima porque ela não se acaba junto. Eu seguro até me esfolar e ela nada. Aí eu perguntei o que eu poderia fazer pra ela se soltar. Com toda a psicologia que ela estuda, não adianta. Não desbloqueia. Eu já tentei todo o tipo de conversa, de carinho e a cada dia ela fica mais retraída. Fica aquela sensação de natureza morta. Será que adianta continuar tentando?"
Como eu sou ridiculamente técnica-exata-científica, dei uma solução que eu tinha aprendido de sopetão:
"Inácio, tu pega um barbeador elétrico, tem aquela parte quentinha, que vibra. Encosta de leve no clitóris dela, falando umas bobaginhas eróticas, que no máximo em cinco minutos ela tem um orgasmo."
" O, Clau, tá maluca? Tá sugerindo que eu use uma espécie de vibrador na Aline?"
"Isto mesmo, o resultado é garantido. Se todo mundo usasse isto acabaria com boa parte da frigi..."
Inácio levantou vermelho, pegou o casaco e foi indo para a porta.
"Mas, Inácio, nunca pensei que tu fosse ficar..."
"Olha, Clau, acho que tu tá viajando. Tá visitando muito sex-shop ou lendo muita porcaria pra me propor um troço destes. Dorme bem." Saiu.
Mas eu não acredito que foi acontecer uma coisa destas!
Não vou mais atender telefone por hoje, nem porta, nem porra nenhuma. Nem vou procurar se eu ainda tenho o depilador elétrico que a minha mãe me deu nos meus quinze anos. Mas será que depilador é tão quentinho quanto barbeador?
- clique AQUI para ver o Diário de Claudeth-1 (Não 53)